Paraguai quer que Itaipu faça empréstimo de US$ 20 bilhões pra reativar economia pós-covid-19

A proposta é do ministro da Fazenda do país, mas o presidente Mario Abdo Benítez já havia feito uma sugestão semelhante ao governo do Brasil, ainda sem resposta.

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H2FOZ – Cláudio Dalla Benetta

A três anos de encerrar a dívida de sua construção, a Itaipu Binacional enfrenta agora uma estranha proposta do Paraguai: bancar um empréstimo de até US$ 20 bilhões para enfrentar a crise provocada pela pandemia de covid-19 nos dois países.

A proposta será apresentada ao Congresso do país pelo ministro da Fazenda do Paraguai, Benigno López, nesta sexta-feira, 29.

O senador Abel González, presidente da Comissão de Energia, disse à rádio Ñanduti que a mensagem do ministro não veio na forma de projeto, mas de um plano que ele vê como saída para revitalizar a economia do país pós-pandemia.

A ideia seria que Itaipu emitisse bônus no valor entre US$ 10 bilhões e US$ 20 bilhões, que seriam pagos num prazo de 10 anos, a uma taxa de 5% ao ano.

Sem resposta

Presidente Mario Abdo Benítez não teve resposta do governo brasileiro. Foto Arquivo

Uma proposta semelhante, na verdade, já havia sido apresentada ao governo brasileiro, antes da pandemia, no sentido de adiantar as negociações do Anexo C e Itaipu endividar-se para ajudar a economia dos países sócios na usina. O governo brasileiro não deu resposta até hoje.

O plano do ministro foi apresentado também num debate virtual promovido pelo Centro de Recursos Naturais, Energia e Desenvolvimento, em conjunto com a Itaipu (Paraguai) e a Faculdade Politécnica da Universidade Nacional de Assunção, como informa o jornal Última Hora.

O ex-ministro da Fazenda do Paraguai Manuel Ferreira Brusquetti, que participou do debate, considera que o país pode precisar de US$ 5 bilhões desse empréstimo, como "parte do plano de ação que engloba todas as etapas de combate ao novo coronavírus". E destacou que o recurso será útil também para o Brasil.

"É quase adiantar a negociação do Anexo C (do Tratado de Itaipu)”, disse Ferreira. O Anexo C, que trata das bases financeiras e da prestação dos serviço de eletricidade de Itaipu, será renegociado em 2023, ano em que a dívida de construção da usina estará praticamente toda quitada.

O ex-ministro disse que a retração econômica provocada pela pandemia exige uma política fiscal expansiva “forte”, que precisa de fundos. Ele disse que o ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, avalia apelar para as reservas internacionais do País, decisão que Ferreira considera "não muito fácil".

Ferreira faz ainda uma suposição. Se forem obtidos US$ 20 bilhões em empréstimos, ficariam US$ 10 bilhões para cada país. O Paraguai usaria US$ 5 bilhões na luta contra a pandemia e sobrariam US$ 5 bilhões. "O problema é o que faremos com esses US$ 5 bilhões, creio que essa é uma discussão interessante", avaliou. Para ele, o empréstimo é uma solução "ganha-ganha" para ambos os países.

Reservas do Brasil

A propósito do que pretende Paulo Guedes, a Folha de S. Paulo (e outros jornais) noticiou, em 11 de abril,  que o ministro da Economia defende, de acordo com senadores com quem conversou, utilizar recursos das reservas internacionais do País para conter os danos provocados pela pandemia.

O Brasil tem reservas de mais de US$ 380 bilhões. A ideia seria utilizar metade desses recursos agora. Segundo o ministro, "o Brasil não precisa de todo este volume em divisas internacionais". Disse ainda que "incongruente um país ter uma dívida pública de quase US$ 4 trilhões e manter reservas de aproximadamene US$ 2 trilhões".

Uma observação: as reservas internacionais do Brasil equivalem a nove vezes o Produto Interno Bruto do Paraguai, o que dá uma dimensão da importância desses recursos e do tamanho da economia brasileira em relação à paraguaia.

Proposta do presidente

Segundo o jornal Última Hora, o presidente Mario Abdo Benítez, em entrevista à Telefuturo, contou que tinha proposto que Paraguai e Brasil discutissem a possibilidade de emissão de bônus por Itaipu, para obter recursos destinados principalmente à recuperação econômica (antes da pandemia).

“Pagando US$ 1 bilhão por ano em cada lado (brasileiro e paraguaio), em cinco anos pode ser quitada uma dívida de US$ 5 bilhões para cada país", havia exemplificado. Mas esclareceu que não obteve resposta do Brasil.  

O ex-ministro Ferreira concorda com o endividamento de Itaipu, que "geraria recursos genuínos para o Tesouro (royalties), sem que se estabeleça uma obrigação para os cofres estatais", já que o Paraguai tem que tomar cuidado com o seu nível de endividamento, próximo do limite.

Protestos

Não se sabe a posição oficial do governo brasileiro. Mas no próprio Paraguai há oposição contra essa proposta, como informa a imprensa do país.

Já estão ocorrendo manifestações contra a "venda da binacional", como disse Evelia Santacruz, que participou de um protesto na quinta-feira, 28, em Hernandarias, sede paraguaia da usina.

"O governo está vendendo Itaipu à máfia internacional para favorecer a máfia nacional", disse ela ao jornal Última Hora. E completou: "Poremos muralhas contra a violência de 70 anos de história e nos autoconvocamos para defender a soberania de Itaipu".

O jornal lembra, ao final da matéria, que o Paraguai contraiu uma dívida de US$ 1,6 bilhão para implantar medidas de emergência contra o novo coronavírus e que, agora, o Ministério da Fazenda analisa novos empréstimos para reativar a economia.

Em 2023

Benigno López, ministro da Fazenda do Paraguai. Foto Agência IP

Independentemente dessa atual proposta, brasileiros e paraguaios se preparam para sentar à mesa de negociações para discutir o Anexo C do Tratado de Itaipu.

Praticamente todos os cenários estudados apontam para a necessidade de diminuição de despesas de exploração, segundo o diretor-geral brasileiro de Itaipu, Joaquim Silva e Luna.

Ele explicou que a usina opera atualmente baseada nos custos de exploração e da dívida contraída para sua construção, mas poderá, a partir de 2023, ir ao mercado de energia elétrica como uma empresa comum, com direito a lucros e até eventuais prejuízos (hoje, o orçamento não prevê sobra de receita).

Do orçamento anual de Itaipu, 63% são destinados ao pagamento da dívida. O resultado das negociações entre Brasil e Paraguai é que determinará o destino da empresa, mas Silva e Luna, desde o início de sua gestão, vem trabalhando pela redução de custos e para "enxugar" os gastos da usina, pelo menos no lado brasileiro.

Segundo ele, o principal desafio, até 2023, "é colocar em marcha o planejamento estratégico que vai preparar a usina para os diferentes cenários dentro de um mercado de energia elétrica complexo, dinâmico e competitivo".

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