Procuradoria pede condenação de instâncias responsáveis por danos ao povo guarani

A decisão busca reparar direitos sofridos pelos indígenas Avá-Guarani desde a construção da Itaipu. Ação requer pagamento de R$ 100 milhões em royalties ao ano aos indígenas.

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A Procuradoria Geral da República (PGR) pediu a condenação da União, do estado do Paraná, da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Itaipu Binacional por danos causados pela usina hidrelétrica de Itaipu aos índios Avá-Guarani. Moradores da região antes da construção de Itaipu, boa parte dos indígenas foram expulsos e excluídos dos processos de reassentamento e reparação promovidos pelo estado brasileiro, aponta a PRG.

A decisão, da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, busca reparar direitos sofridos pelos indígenas desde a construção da usina, entre 1978 e 1982, que se estendem até os dias atuais.

A Ação Civil Originária movida pela PRG está fundamentada em relatório feito pelo Grupo de Trabalho (GT) da Itaipu, vinculado à Câmara de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (MFP). O levantamento revelou inúmeros atos de discriminação perpetrados pelas organizações e entes denunciados, incluindo a negação da existência, identidade e presença Avá-Guarani nos territórios tradicionais atingidos pela construção da usina. Tal processo resultou na remoção forçada dos indígenas da própria terra e na violação dos direitos deles, sustenta a PRG.

A PRG ainda argumenta que a construção de Itaipu implicou na destruição de moradias, redes de parentesco e a e a própria base dos modos de vida e de significação dos Avá-Guarani ao avançar sobre seus lugares históricos e sagrados. "A usina causou a destruição não só do passado e do presente da etnia, mas também comprometeu o seu futuro, por privá-la de reparações e compensações devidas e por provocar o desaparecimento de referências importantes para as futuras gerações", sintetizou a PGR.

Indenização

Na Ação Civil Originária proposta pelo Supremo Tribunal Federa (STF), a PRG requer a condenação dos réus ao pagamento de indenização equivalente a R$ 50 milhões por ano. O cálculo é feito com base no início da construção da usina com propósito de garantir a reparação da lesão, a sanção pelos atos ilícitos e a inibição das condutas relatadas.

A PRG salienta ainda que os réus sejam condenados ao pagamento de danos materiais em razão das perdas acumuladas decorrentes do processo de remoção forçada no valor de R$ 100 milhões anuis, calculados desde o início da construção da usina. À Itaipu Binacional cabe condenação de R$ 100 milhões ao ano ao povo Avá-Guarani como royalties. A finalidade de tal compensação é ser aplicada em saúde, educação, energia elétrica, saneamento, construção de espaços culturais, religiosos e de produção, definidos pelos próprios indígenas por meio de consultas, e sem a interferência de quaisquer réus, conforme a PRG.

Entrada da aldeia em São Miguel do Iguaçu – Imagem ilustrativa/Marcos Labanca

A procuradora Raquel Dogde ainda pede a condenação dos réus para que tomem medidas necessárias à demarcação das terras indígenas como também indenização dos índios pelas áreas alagadas com o estabelecimento do reservatório de Itaipu.

Outro pedido da PRG é a inclusão de disciplina no currículo escolar dos ensinos fundamental e médio que aborde a história indígena, territorialidade, aspectos culturais e antropológicos além da expressa menção à remoção forçada dos índios em virtude da construção da usina. Também pede que seja feita ação educativa nacional voltada para o resgate e promoção da cultura guarani no sentido de combater a discriminação e o racismo. Somado a isso, requer pedido de público de desculpa dos órgãos pelas violações cometidas contra a etnia.

Relatório

O relatório do Grupo de Trabalho da Itaipu analisou as condições de indígenas que ocupavam áreas no Tekoha Guasu Guavirá, entre os município de Guaíra e Terra Roxa, e Tekoha Guasu Ocoy-Jacutinga, entre Foz do Iguaçu e Santa Helena, no Oeste o Paraná. O primeiro grupo tem 14 comunidades e o segundo dez.

De acordo com o estudo, os Avá-Guarani estão presentes no oeste do Paraná e no Paraguai desde o período colonial. Apesar do fato, durante a construção de Itaipu, laudos e diagnósticos precários feitos pela Funai e por outros órgãos de Estado atestaram a inexistência de indígenas nas áreas alagadas, em ação deliberada, tornando as comunidades invisíveis. Assim, o povo guarani ficou excluído dos processos de reassentamento e reparação.

Os danos, segundo o relatório, são sentidos até hoje. Os indígenas estão em áreas não demarcadas e nas cerca de 20 ocupações existentes no oeste do Paraná, as famílias avás vivem “desprovidas de praticamente tudo, convivendo com altos índices de desnutrição infantil e senil – pois se alimentam basicamente de doações de itens de cestas básicas e da criação de alguns pequenos animais –, sem energia elétrica, água potável e estradas ou vias de acesso”.

Também são constantemente ameaçadas de despejo pelas ações de reintegração de posse movidas contra elas. Nesses locais, os indígenas sofrem discriminação, ameaças e violências por parte da usina e dos proprietários formais das áreas onde se encontram. Também são altos os índices de alcoolismo e de suicídios entre os jovens Avá-Guarani.

Por meio da assessoria de imprensa, a Itaipu Binacional informou que não foi notificada sobre a medida judicial e, portanto, se manifestará oportunamente sobre o conteúdo.

Posição da Itaipu

Procurada pela reportagem, a Itaipu Binacional disse que não se pronunciará sobre o assunto por enquanto.

(Fonte: MPF)

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