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Todo mundo agora é autista?

Professor Caverna convida Esther Julia Cordeiro da Silva para explicar sobre o transtorno de espectro autista.

8 min de leitura
Todo mundo agora é autista?


Por Esther Julia Cordeiro da Silva

O transtorno de espectro autista (TEA) é alteração neurológica, apresentada na infância que percorre a vida inteira do indivíduo. E com os avanços da ciência, justifica-se diagnósticos realizados tardiamente, ou seja, na vida adulta. Entretanto, será que todo mundo agora é autista ou estão realizando capacitismo com aqueles que sofrem?

Pessoas que apresentam o TEA são consideradas como PcD, de acordo com a LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015:

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

No autismo, o indivíduo apresenta áreas afetadas como a parte socioemocional, compreensão da comunicação verbal e não verbal, déficit de compreensão de relacionamentos sociais, comprometimento de linguagem e na competência intelectual, hipersensibilidade ou hipossensibilidade sensorial. E isto acarreta dificuldades na área de trabalho, relações familiares, ambiente educacional e ocupacional.

A criança e o adolescente com TEA é real, porém, o adulto com TEA também é real, também sofre, também sente, também tenta pertencer. E o autismo não some quando se cresce, ele continua ali, existindo, por ser um transtorno neurológico, transtorno de neurodesenvolvimento. E o adulto autista não terá os mesmos comportamentos que uma criança autista. Os critérios diagnósticos continuam os mesmos, mas a fase de vida, a faixa etária é outra.

O quanto precisa-se gritar para que os direitos sejam ouvidos? Principalmente de profissionais de saúde mental. O quanto ainda há capacitismo em dizer que quem tem TEA não fala? Não se relaciona? Há casos em que realmente o indivíduo com autismo não consegue falar e usa a Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA) para comunicar-se com o mundo ou até mesmo, os autistas que entram em shutdown (modo desligamento do cérebro para proteção) que ficam não-verbais e podem utilizar da CAA para comunicar ao mundo externo. Mas como sobreviver em um mundo que tem medo do diferente?

Como sobreviver em um mundo em que o adulto autista chega no consultório do profissional de saúde, não é acolhido e recebe medicações desnecessárias? Como sobreviver em um mundo onde profissionais de saúde deveriam atualizar sobre o tema para melhoria da vida dos pacientes – o qual ele fez juramento de cumprir -, mas que apenas a caneta no receituário é mais relevante do que dar um caminho para o indivíduo poder viver sem que as dores o consumam?

Temple Grandin, autista, nível 3 de suporte, em 1947 desenvolveu a máquina do abraço que auxiliava nas próprias crises, como forma de ativar o sistema nervoso autônomo e gerar uma sensação de calma e relaxamento. Entretanto, quando a mãe de Temple a levou para o médico, ele disse que ela JAMAIS falaria e que deveria viver em um manicômio o resto da vida. A mãe não conformou com a fala do médico e fez o melhor que pode para que a filha pudesse desenvolver. Temple aprendeu a falar, realizou faculdade, mestrado e se tornou cientista. Compreendo que naquela época, a visão que tinham do autismo era limitada: culpavam a mãe e chamavam de esquizofrenia. Sem empatia e acolhimento: ao autista e a família que sofria.

E se a mãe tivesse escutado o médico? E se o professor não tivesse investido no potencial dela? E se ela não fosse acolhida? E se ela não tivesse inventado a máquina do abraço? Como seriam as crises? Hoje ela tem 78 anos e segue pelo mundo dando palestra sobre autismo e sobre gado – o qual ela desenvolveu tratamento racional e empático aos animais em abatedouros e fazendas.

O cérebro autista enxerga o que neurotípico não vê e por mesmo não enxergar, talvez gere preconceito e violência. Temple passou por várias situações ruins por ser diferente, mas “é diferente, não inferior”. E nós autistas, mesmo diagnosticados tardiamente, percebemos nossas diferenças no decorrer da vida e por isso, sofremos. Sofremos durante a escola, a realizar curso técnico, a realizar graduação, a estar no âmbito de trabalho.

A dificuldade de compreensão da interação social, das regras sociais: como cumprimentar, como falar, o que falar e ensaiar ao sair de casa. A relevância das pessoas neurotípicas ao toque: abraço, aperto de mão, beijo no rosto e o autista com hipersensibilidade tendo que se mascarar para poder não o acharem estranho demais e ser excluído do ambiente de trabalho, entre os amigos e as vezes até mesmo no sistema familiar. Mas a que custo? Será que vale a pena?

Algumas pessoas autistas têm hipersensibilidade sensorial, ou seja, todo estímulo o cérebro interpreta como perigo, o cortisol sobre e a crise aparece. Isso envolve som, cheiro, textura de comida, roupa ou objeto, visão – luz. Tudo é recebido no cérebro como forma de perigo. E quando se fala de autismo em mulheres, o período menstrual e até mesmo na menopausa, causa ainda mais sensibilidade do que o normal, gerando mais sobrecargas sensoriais rápidas.

As adaptações em ambiente de trabalho, casa, saída com os amigos e/ou reuniões em família, deve-se levar a sério. Mesmo que o diagnóstico foi descoberto na infância, quando se torna adulto, ainda sim precisa das adaptações para poder viver com qualidade de vida. As filas preferenciais nos estabelecimentos que são considerados cheios, não estão ali por estarem. A deficiência existe, não é porque não é visual, que ela deixa de existir. Os danos continuam presente na vida das pessoas. E há taxa 60% dos adultos diagnosticados com Transtorno de Espectro Autista (TEA) que apresentam ideação suicida. Estamos falando de vidas. Estamos falando de pessoas que apresentam dores. É preciso olhar para elas.

Caso não saiba o que dizer ou como ajudar, pergunte. Sempre pergunte como pode auxiliá-la naquele momento. Olhe para o adulto autista, ele também sofre, ele também precisa de suporte. Não há autismo que não precise de suporte.

Se tiver amigo(a) autista, não critique, não o deixe de lado. Estude sobre e pergunte como pode auxilia-lo(a) neste momento da vida. Esteja presente da forma como consegue e seja suporte quando necessitar.

E não, todo mundo agora não é autista. A ciência avançou e aqueles que sofriam sem poder dar nome, tardiamente, agora podem nomear: autismo.

O autista adulto sofre, mas tem direitos para ter possivelmente qualidade de vida para sobre(viver) neste mundo neurotipico.

Essa é a minha história, a história de Temple e de muitos outros. Não temos o cérebro danificado e muito menos somos quebrados. Apenas enxergamos o que ninguém mais vê: a peça do quebra-cabeça que faltava, a matemática nas posições do jiu-jitsu, o gado preso para tomar injeção que consequentemente virou máquina de abraço.

Texto por: Esther Julia Cordeiro da Silva

e-mail: estherjcsilva@gmail.com

Instagram: esther_mundoautista

Convite Especial: Café Filosófico

Reflexões para Pais e Filhos


Prezadas famílias!
Temos o prazer de convidá-los para o V Café Filosófico, um encontro especial onde pais e filhos poderão compartilhar um momento de reflexão e diálogo sobre os dilemas da vida.


Em um mundo repleto de desafios e mudanças constantes, criar espaços para conversas significativas fortalece os laços familiares e amplia nossa visão de mundo. Neste evento, vamos explorar juntos questões que nos fazem pensar, crescer e nos conectar de maneira mais profunda.


Por que participar?
✔ Fortaleça a relação com seu filho(a) por meio do diálogo
✔ Reflita sobre valores, escolhas e desafios da vida
✔ Compartilhe ideias em um ambiente acolhedor e inspirador

Data e local: Zeppelin

Contaremos com um ambiente descontraído e um delicioso café para tornar este momento ainda mais especial!
Venha viver essa experiência enriquecedora conosco! Sua presença fará toda a diferença.
Esperamos você e sua família!

Ingressos para o V Café Filosófico:

https://cafefilosoficoo.lojavirtualnuvem.com.br/produtos/1-lote-ingressos

Comunidade do “Café Filosófico” no WHATSAPP:

https://chat.whatsapp.com/Ewehn3zxEBr6U0z96uZllP

Obs. Caro leitor, o objetivo aqui é estimular a sua reflexão filosófica, nada mais! mais nada!

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    Professor Caverna

    Caverna é professor de Filosofia, criador de conteúdo digital e coordenador do projeto “Café Filosófico” em Foz do Iguaçu.