O problema da “transmissão importada”

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Júlio da Silveira Moreira I OPINIÃO

A pandemia em Foz do Iguaçu, assim como em todo o sul e centro-oeste do Brasil, está na situação mais grave desde seu início. Nesse contexto, o acesso às informações é muito importante na prevenção e resposta. Desde o início da pandemia, a Prefeitura de Foz do Iguaçu tem divulgado boletins epidemiológicos elaborados por acadêmicos da UNILA. Desde o pico, no mês de junho, tem feito uma rotina diária de apresentação em vídeo do boletim e comunicados à população.

A Prefeitura de Foz e a Secretaria Municipal de Saúde, que tinham sites precários e sem atualizações, agora têm sites pesados que demoram muito para abrir. Já o site da Agência Municipal de Notícias (www.amn.foz.br) tem procurado concentrar informações sobre a pandemia. Apesar disso, não há um banco de dados completo dos boletins diários para permitir análises comparativas e séries históricas.

O motivo desse artigo de opinião é abordar um dado que, em minha percepção, não está sendo bem interpretado nos boletins epidemiológicos diários: o das transmissões importadas.

O município teve 768 casos positivos durante o mês de junho, um aumento de 600% em relação ao total acumulado entre 18 de março e 31 de maio. O aeroporto de Foz do Iguaçu foi reaberto em 4 de maio. Desde então, a cidade tem recebido pelo menos três voos diários, de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, no período em que essas cidades tiveram seus picos de contágios.

Nos boletins diários, os gráficos sobre tipos de transmissão têm dado a entender que a transmissão importada, que era maioria no mês de abril, cedeu lugar à transmissão comunitária, nos meses de maio e junho. O boletim de 3 de julho apontava: 63% de transmissão comunitária, 26% de transmissão local (quando se sabe de quem veio o contágio) e 11% de transmissão importada. A prefeitura flexibilizou com a abertura do comércio, os atrativos turísticos foram reabertos, a população encheu as ruas, mas parte da opinião pública, na construção social dos discursos, na ânsia de buscar culpados, ficou falando apenas que o problema foi o “pessoal que fez festinhas”. Logo vieram as notícias dos frigoríficos (assunto que ainda quase ninguém fala), e no momento estão falando muito dos supermercados – e com razão. Também é algo que ninguém fala explicitamente, mas dá a entender: que a transmissão importada deixou de ser importante.

É preciso lembrar que a transmissão importada alimenta a transmissão comunitária. Se for tomada a estimativa em que uma pessoa contagiada transmite o vírus para outras quatro, para cada caso de transmissão importada terá mais quatro casos de transmissão comunitária. Nesse pequeno círculo, a proporção será de 20% para 80%. É óbvio que os dados de transmissão comunitária serão maiores e tendem a mascarar a importância da transmissão importada.

É certo que os órgãos de prevenção têm instalado barreiras sanitárias nos locais de acesso à cidade, incluindo aeroporto, rodovias e rodoviária. Porém, sabemos que o controle das barreiras sanitárias se resume a um questionário se a pessoa teve algum sintoma nos últimos 14 dias e ver a temperatura. A questão dos “assintomáticos” é bem relativa, até porquê está baseada na autodeclaração.

As pontes que ligam Foz do Iguaçu ao Paraguai e a Argentina estão fechadas, mas não está fechada a ponte que liga Foz do Iguaçu a São Paulo, um “país” com muito mais contágios e óbitos que qualquer outro país da América Latina (lembrando das comparações feitas em artigo de Cláudio Dalla Benetta no H2FOZ).

Vale lembrar que, na Argentina, todos os voos domésticos foram e continuam suspensos desde o início da pandemia. No início da pandemia, o governo brasileiro se preocupou com a transmissão importada de outros países, e muitos cidadãos ficaram impedidos de retornar ao Brasil. Porém, quando o assunto é transmissão importada dentro do país, não há a mesma atenção dos gestores e da população.

 

 

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