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Professor lamenta morte de acadêmica e relembra casos similares de docentes

Professor da Unila cita assédio com docentes, incluindo ele próprio.

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Professor lamenta morte de acadêmica e relembra casos similares de docentes
Assédio moral é tema delicado e faz vítimas silenciosas. Foto: Freepik

Aida Franco de Lima – OPINIÃO

O caso de Isabelly Baldin, 27, acadêmica de Medicina da Universidade da Integração Latino-Americana (Unila), que foi encontrada morta no último dia 16, é um sinal de alerta em meio a acontecimentos que destoam do que se espera de um ambiente universitário: aprendizado e respeito mútuo de indivíduos que convivem por anos juntos. Ela era autista e foi sepultada um dia antes do Dia Nacional do Orgulho Autista, 18 de junho.

A citada atmosfera não se restringe somente à Unila, onde a jovem estudava e mesmo espaço em que relatou e denunciou a órgãos oficiais, nominalmente, professores e colegas de sala que a perseguiam e praticavam bullying. De norte a sul do Brasil, há um desafio que vai além das provas. É a decisão entre aceitar e engolir a seco determinadas situações ou “comprar” briga e não ter certeza de que será possível passar em uma matéria ou elevar o nível da carreira. Muita gente prefere não arriscar. Outros, adoecem.

Importante dizer que os relatos de Isabelly não eram em relação à universidade como um todo e que há que separar o joio do trigo. E que por isso é necessário que a instituição, e qualquer outra, corte na própria carne. Do contrário, a sangria atinge e pode manchar todos. Isabelly deixou nomes e sobrenomes de pessoas que, conforme outras denúncias, são expostas inclusive abertamente em redes sociais, repetitivamente estão envolvidos em conflitos graves. Esses nomes que, possivelmente, sentiram-se livres para ultrapassar barreiras minimamente éticas, foram registrados e provavelmente deverão ser acionados pela Justiça. Pois espera-se que alguém seja punido exemplarmente pela co-responsabilidade da avalanche emocional que sufocou a jovem.

Esse não é um caso isolado, não é o primeiro em que nos deparamos com denúncias e graves consequências da toxidade que toma conta de espaços universitários. E do mesmo modo que Isabelly se sentia alvo de assédio moral e bullying de seus “colegas” de sala, o mesmo ocorre com professores e funcionários, seja por parte dos superiores, seja até mesmo por alunos. Não há quem esteja livre de ser o alvo. E não há universidade que esteja blindada. Umas mais, outras menos. Umas cujos casos são abafados e não chegam até a mídia. Outros em que a mídia não se interessa. E aqueles que são absorvidos somente pela vítima.

Bullying, etarismo, assédio moral, perseguições. Esses temas devem vir à tona para que a sociedade esteja apta a prevenir e, se preciso for, punir. As universidades precisam adaptar-se às demandas estagnadas, criar canais de atendimentos efetivos e assegurar que direitos básicos de Pessoas com Deficiência (PcDs) sejam concedidos sem que, necessariamente, a Justiça, muitas vezes lenta, não chegue a tempo.

O texto abaixo é de um professor da Unila e faz referência a dois professores que cometaram suicídio em 2019 e 2024. O nome do autor do texto foi preservado, para que não adoeça ainda mais. Ele também é alvo de assédio moral.

Luto por Isabelly

“Nesta última segunda feira, 16 de junho,48 horas antes do Dia do Orgulho Autista, uma jovem estudante do Curso de medicina da Unila se foi. Isabelly tem sido apresentada assim (eu não a conhecia pessoalmente) mas certamente a parte mais importante dela não era sobre isso. Quem a conhecia de verdade, familiares e amigos próximos sabiam que ela era muito mais . Uma pessoa com dores e alegrias, sonhos, expectativas e direitos… Infelizmente a Universidade não reconhecia nada disso e foi decisiva (pelas próprias palavras dela) pelo abismo emocional aonde ela se encontrava. No primeiro momento a Unila divulgou uma nota de pesar de gaveta, como divulgou quando da morte de outros membros da comunidade universitária. Minimamente questionada divulgou uma outra, se dizendo “consternada” e afirmando que culpava os “influencers” autistas por uma campanha de difamação. Logo a Unila, que se orgulha de dar voz a tanta gente de origens diferentes, divulga uma nota capacitista zombando de quem sim, tem lugar de fala.

A Isabelly certamente não foi a primeira (nem sequer uma das primeiras…) que, infelizmente, foi vítima de um assédio moral agressivo, institucional (uma vez que brotou e enraizou-se nas dependências do campus) que levou a esse desfecho trágico.

Existem outros casos no passado não muito distante da Unila. Professores que sofreram assédio moral, por “colegas” de curso que não resistiram e tiraram a própria vida. O tema é espinhoso, eu sei, se fala baixinho nos corredores, ou nem se fala, por um misto de vergonha, cinismo e culpa. Infelizmente a história se repete, e eu me solidarizo com os familiares da Isabelly. Não tenho palavras de consolo, pois neste momento eu sei, pois já passei por isso com pessoas muito queridas mais de uma vez, a não ser honrar a memória dela, e torcer para que a opinião pública pressione para trazer a luz do sol à verdade e o envolvimento das pessoas que fizeram o que puderam para causar isso.

O histórico de assédio moral na Universidade é ultrajante, na medida em que não é apurado e continua destruindo vidas. E uma delas é, também, a minha…”

O Brasil conta com um serviço gratuito para apoio emocional e orientação em situações de dificuldades. Formado por voluntários, o Centro de Valorização da Vida (CVV) atende 24 horas por dia, com sigilo e anonimato, na internet e pelo telefone 188.

Este texto é de responsabilidade do autor/da autora e não reflete necessariamente a opinião do H2FOZ.

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Aida Franco de Lima

Aida Franco de Lima é jornalista, professora e escritora. Dra. em Comunicação e Semiótica, especialista em Meio Ambiente.

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