Aida Franco de Lima – OPINIÃO
Renato Russo tem uma letra de música cujo trecho diz: “É tão estranho, os bons morrem jovens.” E, nesta semana, o mundo perdeu o genial arquiteto chinês Kongjian Yu, no último dia 24, em acidente aéreo no Pantanal, juntamente com três outras pessoas que ocupavam o avião. Eram o piloto Marcelo Pereira de Barros e os documentaristas brasileiros Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz e Rubens Crispim Junior. Eles gravavam justamente um documentário sobre o conceito das cidades-esponjas. A jovialidade de Yu, 62 anos, estava principalmente em suas ideias inovadoras.
E se você perguntar o que é uma cidade-esponja, a resposta é muito infeliz. É tudo aquilo que não acontece na sua cidade. É o oposto do que a prefeitura e mesmo os moradores promovem, salvo raras exceções. Cidades-esponjas são ambientes preparados para drenar as águas. E eu digo que é o oposto do que temos ao nosso redor, pois o que presenciamos são áreas tomadas por concreto. Não bastasse a destruição das árvores, há a impermeabilização do solo. Como já falamos muitas vezes por aqui.

Yu acreditava que os projetos urbanos deveriam adaptar-se aos desenhos naturais dos terrenos e ter os rios, a vegetação, o relevo em si como pontos favoráveis para a vida urbana. Em vez de destruir e apresentar esses atributos naturais como empecilhos do desenvolvimento, passariam a ser aliados da qualidade de vida.
- Em vez de lutar contra a água, a proposta de Yu passaria por três processos: a retenção da água no solo, que pode ser potencializada por meio de lagos ou açudes; telhados e fachadas verdes ou valas com áreas verdes, que ajudam na absorção da água. A segunda etapa seria desacelerar o fluxo da água pelo relevo dos rios, com a vegetação. A terceira etapa, a cidade preparar áreas alagáveis, que possam receber o fluxo hídrico sem haver destruição.
Essas ideias parecem tão simples, mas a impressão que nossos gestores deixam é de que é preciso complicar no lugar de simplificar. Afinal, quando foi que você viu uma área construída de prédios ser derrubada para que uma mata fosse plantada?
Olhe para o seu quintal ou para a frente de sua moradia. Qual é o percentual de área em que o solo não está revestido de concreto ou outra pavimentação? Nem o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA) dá conta de verificar se realmente há área de drenagem nos quintais.
As cidades de concreto são mais rentáveis, pois tornam os processos licitatórios mais interessantes. As prefeituras contratam empreiteiras para revitalizar praças com projetos duvidosos, com estética cafona e potencial ambiental nulo.
Parece que há um pacto em destruir praças com cara de praça e construir elefantes brancos. Já falei disso aqui recentemente.
No design, menos é mais. Na natureza, menos agressão à natureza é mais qualidade de vida a todos. Entretanto, o homem ainda não aprendeu isso. Há uma pequena parcela da sociedade que usa sua sabedoria para tentar salvar o planeta. Yu deixou o seu legado. Não sei se haverá praças ou ruas com seu nome. Porque ele pregava a vida, não a morte. Renato Russo estava certo sim. Os bons morrem jovens, porém o importante é que o legado de Yu já ficou. Todas as vezes que as nossas cidades sofrerem com as enchentes, alguém vai lembrar. Há um caminho. Precisamos segui-lo.
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