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Filosofia para o dia a dia

Filosofia

Os desafios de ser pai no século XXI

Professor Caverna convida Álvaro Albuquerque Neto para refletir sobre a paternidade no século XXI.

7 min de leitura

Por Álvaro Albuquerque Neto

Há vinte e seis anos, fui iniciado no ofício sagrado e imprevisível da paternidade. Tornei-me Pai pela primeira vez. Era um mundo diferente, com seus próprios dilemas e encantos. Depois, aos dez anos desse percurso, novamente fui presenteado com a paternidade. Hoje, passadas mais de duas décadas desde aquele primeiro choro que ouvi em uma maternidade, me vejo diante do mesmo milagre mas, desta vez, à espera de uma menina. Três filhos, três tempos distintos da vida, três convites à reflexão sobre o que significa ser Pai neste século veloz, incerto e, paradoxalmente, carente de presença.

A pergunta, à primeira vista simples, nos arrasta para águas profundas. Não se trata apenas de cuidar ou educar. Ser Pai é um exercício de filosofia viva. É o eterno confronto entre o ser e o dever-ser, entre o desejo de proteger e a necessidade de deixar ir. É, como diria HERÁCLITO, estar imerso em um rio onde nada é fixo nem o pai, nem o filho, nem o tempo.

A tal modernidade líquida de BAUMAN esgarçou as certezas que sustentavam as gerações anteriores. A figura do Pai, antes associada à autoridade inquestionável, foi desafiada e ainda bem. Hoje, somos convocados a exercer a paternidade com mais escuta do que imposição, com mais afeto do que distância. Mas essa transição não é fácil. Não fomos ensinados a ser vulneráveis. Fomos educados para conter lágrimas, não para acolhê-las.

Quando olho para meus dois filhos um homem feito e um adolescente em pleno vôo, percebo o quanto a paternidade me moldou mais do que qualquer outro papel. Aprendi com eles que o tempo dos filhos não é o nosso. Que educar é mais como plantar do que como esculpir. E que não há livro, por mais denso, que ensine o que se descobre em um abraço dado no momento certo.

Agora, ao esperar por uma filha, essa jornada ganha nova coloração. Há uma beleza delicada, mas também uma responsabilidade imensa, em educar uma menina num mundo que ainda cobra dela mais do que dos meninos. Como Pai, quero que ela saiba que não precisa ser perfeita só precisa ser inteira. E que encontrará em mim não um juiz, mas um porto, um espelho que reflete amor, liberdade e confiança.

Ser Pai de uma menina também me obriga a confrontar minhas próprias crenças e silêncios. Afinal, que tipo de mundo estou ajudando a construir para ela? Será um mundo onde o feminino é respeitado? Onde há espaço para ser sensível sem ser frágil? Onde o cuidado não é visto como fraqueza, mas como força profunda?

Em muitos momentos tento procurar respostas na filosofia. ROUSSEAU dizia que o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe. E eu me pergunto: como educar para preservar essa bondade? Como não deixar que o mundo, com suas pressões, apague a chama da autenticidade em nossos filhos?

NIETZSCHE, por outro lado, falava da importância de “tornar-se quem se é”. Um chamado à autenticidade radical, que exige coragem tanto do filho, para encontrar sua própria voz, quanto do Pai, para não impô-la. Talvez a grande tarefa de um Pai seja justamente essa: não moldar, mas libertar.

E é nesse ponto que a poesia de RENATO RUSSO ressoa com força, em uma de suas letras mais íntimas e reveladoras: “Você culpa seus pais por tudo, isso é absurdo. São crianças como você. O que você vai ser quando você crescer?”

Esse trecho é um espelho incômodo, mas necessário. Somos, de fato, crianças crescidas. Tentamos acertar onde erraram conosco. E, inevitavelmente, erramos de outras formas. Mas se há algo que tento ensinar aos meus filhos é que vulnerabilidade não é sinônimo de fraqueza. Que pais não são deuses. São homens. Falhos. Humanos. Mas, se forem honestos, podem ser faróis.

Vivemos uma era onde a masculinidade tóxica ainda ronda muitos lares, mascarada de força, de dureza, de controle. Recusar esse modelo é uma tarefa urgente. Quero que meus filhos saibam que um homem pode e deve chorar, cuidar, acolher. E quero que minha filha cresça sabendo que não precisa se encolher para caber no mundo de ninguém.

O desafio da paternidade contemporânea é múltiplo. Envolve questões éticas, emocionais, digitais. Como educar num mundo onde a infância é constantemente invadida pela ansiedade adulta? Como ensinar presença em um tempo de distrações infinitas? Como concorrer com o celular, com os vídeos curtos, com as redes sociais, com a pressa constante?

A resposta talvez não esteja na luta contra o tempo, mas no cultivo do instante. No café da manhã sem celular. No passeio ao parque sem hora marcada. No ouvir sem interromper. No pedir perdão. Sim, porque pais também erram. E pedir perdão aos filhos não nos diminui, humaniza.

Mais do que ensinar, um Pai do Século XXI precisa aprender. Aprender a se desconstruir. Aprender a dialogar. Aprender a deixar espaço para que o outro seja. E, acima de tudo, aprender a amar de forma ativa, presente e transformadora.

Se ser Pai no século passado era sobre autoridade, no atual é sobre presença. Se antes era sobre fazer filhos seguirem um caminho, hoje é sobre ajudá-los a trilhar o próprio. Ser Pai hoje é ser jardineiro de almas regar, cuidar, proteger, mas sem sufocar. É preparar o terreno para que floresçam do seu jeito, no seu tempo, com suas cores.

Em meio às crises e mudanças do nosso tempo, podemos pensar no filósofo KIERKEGAARD, que dizia que a vida só pode ser compreendida olhando para trás, mas só pode ser vivida olhando para frente. Talvez seja isso que os filhos nos ensinem: a olhar para a frente com mais fé, mais leveza, mais humildade.

E quando minha filha nascer, daqui a alguns meses, quero recebê-la com essa disposição: de não ser um Pai perfeito, mas um Pai real. Presente. Disposto a aprender com ela, como aprendi com os meninos. Porque, no fim, como escreveu RENATO RUSSO, “é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã”. E nisso, os filhos são nossos melhores mestres.

E hoje ao ser ‘desafiado’ pelo ilustre filósofo PROFESSOR CAVERNA sobre “qual é o maior desafio de ser Pai no século XXI”, eu posso responder com simplicidade: é amar com coragem. Coragem de estar. De sentir. De mudar. De se refazer. De admitir que somos aprendizes, mesmo depois de duas, três, dez experiências. Porque cada filho nos reinventa. E, com eles, nos tornamos não apenas pais, mas humanos mais completos.

AUTOR: Álvaro Albuquerque Neto
Advogado, defensor dos Direitos Humanos, tentando sempre ser um ‘livre pensador’ (seja lá o que isso quer dizer).
E-mail: awa.alvaroneto@gmail.com

Convite Especial: Café Filosófico

Reflexões para Pais e Filhos


Prezadas famílias!
Temos o prazer de convidá-los para o V Café Filosófico, um encontro especial onde pais e filhos poderão compartilhar um momento de reflexão e diálogo sobre os dilemas da vida.


Em um mundo repleto de desafios e mudanças constantes, criar espaços para conversas significativas fortalece os laços familiares e amplia nossa visão de mundo. Neste evento, vamos explorar juntos questões que nos fazem pensar, crescer e nos conectar de maneira mais profunda.


Por que participar?
✔ Fortaleça a relação com seu filho(a) por meio do diálogo
✔ Reflita sobre valores, escolhas e desafios da vida
✔ Compartilhe ideias em um ambiente acolhedor e inspirador

Data e local: Zeppelin

Contaremos com um ambiente descontraído e um delicioso café para tornar este momento ainda mais especial!
Venha viver essa experiência enriquecedora conosco! Sua presença fará toda a diferença.
Esperamos você e sua família!

Ingressos para o V Café Filosófico:

https://cafefilosoficoo.lojavirtualnuvem.com.br/produtos/1-lote-ingressos

Comunidade do “Café Filosófico” no WHATSAPP:

https://chat.whatsapp.com/Ewehn3zxEBr6U0z96uZllP

Obs. Caro leitor, o objetivo aqui é estimular a sua reflexão filosófica, nada mais! mais nada!

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Assuntos

Professor Caverna

Caverna é professor de Filosofia, criador de conteúdo digital e coordenador do projeto “Café Filosófico” em Foz do Iguaçu.

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