Aida Franco de Lima – OPINIÃO
Final de ano, época de festas, formaturas, comemorações, alegria e muito barraco. Normalmente, o álcool que é usado para descontrair, quando passa dos limites, serve de combustível para incendiar os ambientes. E quando a música, que é para alegrar o espaço, transforma-se no pivô da confusão? Foi o que aconteceu na festa de formatura de alunos do ensino médio do Colégio Madre de Deus, em Recife, na última sexta-feira (12).
A festa corria solta. Próximo das 5h, segundo testemunhas, em certo momento, o pai de um dos formandos se incomodou com uma música e foi para cima do DJ, para impedir a execução de Helicóptero, de DJ Guuga com MC Pierre. Os demais formandos não aceitaram a interrupção da festa e se juntaram para brigar com o referido pai.
Participantes da festa disseram que a mesma música tinha sido tocada anteriormente, em outros ritmos, por duas vezes. Foi, então, na terceira vez, ao ritmo de funk, que o homem, com sinais de embriaguez, interrompeu o DJ de modo ofensivo. Nos vídeos que circulam nas redes sociais, uma mulher também critica a letra da música, destacando ser imprópria para adolescentes.
O ditado que diz “não adianta chorar sobre o leite derramado” pode ser adaptado aqui para “não adianta chorar sobre a música viralizada”. Não vai ser interrompendo uma festa, expondo o filho ou filha à humilhação pelos colegas, que o problema vai ser resolvido. Porém, ele lança luz ao tema…
Ah, e o que tem essa música para causar tanta polêmica? Nada de mais, para alguns. Apenas a realidade da periferia que muitos não conhecem, diriam. Mas não! A tal música, que não vou pôr os trechos aqui, porque são nojentos, diz basicamente para uma menina que está em um helicóptero que ela tem duas opções: ser estuprada ou jogada no mar. Violência extrema, em uma letra de música com quase 70 milhões de visualizações em uma das mais conhecidas plataformas musicais, desde quando foi lançada em 2019.
Nestes meses em que os casos de feminicídio tomaram conta das manchetes na mídia, como já tratamos aqui, cantar é também verbalizar a violência. É transformar crimes em hit.
Provavelmente, muitos pais que estavam na festa não prestaram atenção na letra em nenhuma das vezes em que foi executada — e, se perceberam algo, preferiram não se manifestar no ambiente festivo. Mas e nas residências, no convívio cotidiano, será que conversam a respeito das influências musicais de seus filhos? Será que esses mesmos pais não entoam músicas com outros ritmos, porém com letras de teor similar?
A presença da mídia está impregnada no cotidiano, principalmente dos mais jovens que vivem “grudados” nas telas. Em relação às músicas, é bastante comum que a pessoa se interesse pelo ritmo e saia cantarolando aquelas frases “chicletes”. Quando se trata de letra de música internacional, há um álibi, porque nem todos têm acesso à tradução. Contudo, o que presenciamos são milhares de visualizações e seguidores para influenciadores/cantores que, não apenas fazem apologia, falam explicitamente sobre violência.
Aqueles pais da briga, certamente, envergonharam seus filhos. Um momento que seria de celebração trouxe lágrimas de tristeza em vez de saudosismo por um ciclo que se encerrou. Porém, botaram o dedo em uma ferida exposta em nossa sociedade. Inúmeros pais ou responsáveis levam crianças e adolescentes a shows, fazem dancinhas, gravam vídeos e parecem não conectar o que cantam com a realidade. Será que vão esperar para prestar atenção quando essas crianças, no futuro, vestirem as becas?
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