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Etanol nas bebidas: indústria não pode dividir conta com consumidor

Lobby da indústria conseguiu afrouxar normas para fiscalização e agora que o problema veio à tona esperneia diante das contaminações e casos fatais.

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Etanol nas bebidas: indústria não pode dividir conta com consumidor
A pessoa quer sair e beber e nao ter que se preocupar se o produto é violado ou não. Foto: Freepik
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Aida Franco de Lima – OPINIÃO

A ocorrência de pessoas intoxicadas por conta da ingestão de metanol, principalmente em bebidas destiladas, como cachaça, uísque, vodca e gim, colocou o Brasil em alerta.

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Até o momento foram computados 225 casos que estão investigação, sendo 15 óbitos. A média anual, oficial, era de 20, normalmente vitimando moradores de rua que turbinam seus próprios corotes com álcool de posto de gasolina.

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Conforme o Ministério da Saúde, foi no fim de agosto que aconteceram os primeiros casos. Mas no final de setembro, o problema veio à tona, depois que médicos de São Paulo, de diferentes hospitais, narravam diversos sinais muito similares aos de intoxicação por metanol: náusea, dor abdominal, tontura, dor de cabeça, visão turva, cegueira, convulsão, dano ao cérebro e até morte.

O problema se agrava quando a vítima confunde os sintomas com uma ressaca forte e demora a procurar auxílio médico. Entre 12 horas e 14 horas depois da ingestão, os sintomas pioram, com visão turva e respiração ofegante. Quando passadas 48 horas, a cegueira pode ser irreversível, assim como falência dos órgãos. Portanto, quanto mais tempo passa para que o tratamento seja iniciado, piores as consequências. Se considerarmos que a pessoa ingere a bebida de noite e madrugada, e em seguida vai dormir, quando acorda e imagina estar de ressaca, suas chances de recuperação diminuem. A quantidade ingerida e o nível de hidratação impactam no efeito do tratamento.

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Ainda não há uma linha de investigação certeira a respeito das origens da contaminação. Já foi cogitado desde o envolvimento da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), contaminação pelo uso da substância durante o processo de lavagem dos vasilhames, até a contaminação provocada por grande distribuidora que comercializa produtos em todo o Brasil.

Apreensão de garrafas, bares fechados em São Paulo e investigações estão em andamento. Enquanto isso, o Ministério da Saúde está providenciando a importação de 2.500 unidades do antídoto, Fomepizol,de fabricante japonês.

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Duas informações se destacam em meio aos dados numéricos dos casos de contaminação.

  • A primeira é de que foi em 2016, durante o Governo Temer, que a Receita Federal desativou o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe), o principal mecanismo de monitoramento da produção em tempo real de cervejas, refrigerantes, destilados e outras bebidas industrializadas no Brasil. Quando o Ato Declaratório Executivo n.º 75/2016 passou a vigorar, a Receita suspendeu sua obrigatoriedade. Mas por qual motivo? Teria sido o alto custo de manutenção do sistema. Quem lucrou com essa medida foi a indústria de bebidas, como grandes grupos fabricantes de cervejas e refrigerantes, que reclamava da fiscalização, da carga tributária.

A segunda informação é de que, para haver a adulteração das bebidas, é preciso das embalagens. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) destaca a importância de os consumidores adotarem medidas de segurança no descarte de garrafas de bebidas destiladas, porque há um mercado paralelo em busca dessas embalagens.

Não bebo, mas separo o meu lixo há décadas. Vocês imaginam mesmo que a pessoa que não se importa em dar destino adequado ao lixo diário vai preocupar-se com sua garrafa, depois que o álcool o deixou com aquela “tonturinha”?

É responsabilidade da indústria desenvolver a logística reversa e ter de volta as embalagens, que se não são usadas para falsificar produtos estão poluindo o ambiente. Mais uma vez, a indústria quer ficar com o bônus da lucratividade e deixar o ônus, como a violência e as doenças causadas pelas bebidas, e agora a suposta segurança em sua fabricação, nas costas do consumidor.

Sabe quando você está na mesa do bar e é o primeiro a deixar o copo virado, para mostrar que não quer beber mais, e alguém diz: “Se não aguenta, por que veio?” Pois bem, se a indústria não consegue garantir o retorno das embalagens que ela lança no mercado deveria valer também a lógica da mesa do bar. Se não aguenta blindar seu produto de falsificações, por que é que veio?

Este texto é de responsabilidade do autor/da autora e não reflete necessariamente a opinião do H2FOZ.

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    Aida Franco de Lima

    Aida Franco de Lima é jornalista, professora e escritora. Dra. em Comunicação e Semiótica, especialista em Meio Ambiente.

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