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IFSC Palhoça: respeito à diversidade

Estudantes surdos de todo o Brasil migram em busca de ensino bilíngue Libras-Português.

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IFSC Palhoça: respeito à diversidade

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Aida Franco de Lima – OPINIÃO

Na última semana, a notícia da morte da acadêmica de medicina da Unila Isabelly Baldin, 27 anos, trouxe à tona os bastidores silenciosos dos obstáculos enfrentados por universitários que se enquadram no transtorno do espectro autista (TEA), que vão muito mais além da rotina clássica de aulas, provas, trabalho, estágio. As redes sociais foram inundadas de relatos de acadêmicos e pais de diversos lugares do Brasil, nas mais diversificadas instituições. Assédio moral, bullying, capacitismo, entre outros. Mas isso não é, necessariamente, o retrato completo de ambientes universitárias. É um fragmento, triste, forte e impactante — que precisa urgentemente ser revisto. Uma cultura por parte de uns, que tende a contaminar o todo. E é importante nos lembrarmos de espaços que fazem a diferença na vida de alunos, que além de ensinarem o conteúdo educacional demonstram na prática de que modo a inclusão sai do discurso teórico e entra na prática. Como o Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) — unidade de Palhoça.

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Tive a oportunidade de conhecer in loco o ambiente e confesso que jamais tinha visto uma unidade educacional com tal nível. Trata-se da primeira unidade da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica do Brasil a oferecer educação profissional e tecnológica na perspectiva bilíngue (Libras–Português). “A proposta é trazer ao cenário brasileiro experiências de ensino, pesquisa e extensão que viabilizem uma efetiva interação entre surdos e ouvintes no campo educacional e profissional”, diz o site. Mas vai além. O site não informa que gente do Brasil inteiro vai em busca do IFSC; que professores são estimulados a aprender Libras, presencialmente ou virtualmente; que há equipes de Aida Franco de Lima – OPINIÃOintérpretes para qualquer atividade que se tenha necessidade de tal suporte. E que há uma cultura para estimular a inclusão, o respeito. Uma lição que precisa ser feita por todos.

Em uma das turmas na qual lecionei havia um grupo de cinco autistas, e sempre que necessário uma professora de atendimento educacional especializado (PAEE) dava suporte. Contudo, o mais interessante, ao menos nessa turma, era o modo como os demais colegas agiam. Eles eram comunicativos e barulhentos, e quando eles próprios percebiam que o barulho estava incomodando os colegas mais sensíveis ao ruído, eles mesmos pediam silêncio. E em todos os trabalhos ninguém era excluído. Todos se ajudavam, ninguém questionava qualquer direito concedido a algum aluno que necessitasse exercê-lo.

A cena mais comum no ambiente são alunos, professores, funcionários, prestadores de serviço comunicando-se em Libras e muitos improvisando também. Porque o mais importante é comunicar-se, independentemente de dominar ou não a técnica. Cheguei a frequentar algumas aulas. O professor que tive é surdo oralizado e em suas primeiras aulas nos explicou que sua mãe foi a grande responsável por ele frequentar anos fonoaudiologia, para que no futuro tivesse menos dificuldades para ser inserido na sociedade.

A estrutura do prédio é relativamente nova e não deixa nada a desejar, com elevadores que funcionam, rampas, banheiros adaptados, espaços de lazer por todos os lados, o máximo de paredes com avisos, quadros, recados, lembrando a importância do respeito à diversidade. Na biblioteca, os alunos começam quebra-cabeças de milhares de peças, e outros continuam na sequência. Os laboratórios são abertos com digitais dos professores, e as salas de aulas, com uma única chave que abre todas as demais. Todas as salas de aulas são equipadas com aparelhos multimidia, que funcionam. Há inúmeros locais para descanso e inclusive redário. Há espaços para jogos de tênis de mesa, fora as quadras poliesportivas. E material para os professores, como canetões, impressões e outros, é de fácil acesso.

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No final de semana, o H2FOZ trouxe matérias com dados sobre o autismo em Foz do Iguaçu. Quando é analisado o perfil dos diagnósticos em Foz, observa-se que a prevalência é maior entre homens (2.687) do que entre mulheres (1.463). O grupo etário de 5 a 9 anos concentra a maioria dos casos (793), e mais da metade das pessoas autistas (2.011) tem até 14 anos. Ainda assim, o diagnóstico se distribui por todas as faixas etárias, incluindo adultos e idosos.

Isso significa que ainda dá tempo de essa metade da população acessar universidades que realmente coloquem em prática a Lei n.º 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, e a Lei n.º 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência). A luta por uma vaga, por um diploma, não deve ser algo que coloque em risco a saúde mental.

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Aida Franco de Lima

Aida Franco de Lima é jornalista, professora e escritora. Dra. em Comunicação e Semiótica, especialista em Meio Ambiente.

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