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Desmonte da memória: o caso do painel de Miguel Hachen em Foz do Iguaçu

Reflexões sobre o descaso e a falta de preservação do patrimônio cultural

4 min de leitura
Desmonte da memória: o caso do painel de Miguel Hachen em Foz do Iguaçu
Tais acontecimentos escancaram a negligência com a memória coletiva e a identidade local. Foto: Denise Paro

Giane Lessa – OPINIÃO

Foz do Iguaçu, uma cidade marcada por sua diversidade cultural e histórica, tem enfrentado episódios alarmantes de desmonte de seu patrimônio. Entre os casos mais emblemáticos estão a derrubada da antiga Santa Casa, a retirada do Monumento à Democracia da Praça Naipi e a destruição do painel artístico do artista Miguel Hachen.

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Tais acontecimentos escancaram a negligência com a memória coletiva e a identidade local, trazendo à tona a urgência de reflexão sobre a preservação cultural.

A Santa Casa de Foz do Iguaçu foi, durante décadas, referência em saúde e solidariedade para a população local. Sua edificação, além de possuir valor arquitetônico, era carregada de simbolismo histórico, representando a luta de gerações por melhores condições de vida.

A decisão de demolir o prédio, sem alternativas de restauro ou reaproveitamento, foi recebida com indignação por setores ligados à cultura e pela população. Tal ato não apenas apagou parte da história da cidade, como também desrespeitou a memória de quem ajudou a construir sua trajetória.

Outro episódio significativo foi a retirada do Monumento à Democracia, símbolo de luta e resistência popular. Além de sua importância estética, o monumento fazia referência às conquistas democráticas e servia de ponto de encontro para manifestações cívicas.

Sua remoção, sem diálogo com a sociedade civil ou justificativas convincentes, representa um retrocesso na valorização dos marcos históricos de Foz do Iguaçu e evidencia o distanciamento entre poder público e comunidade.

O painel do artista plástico Miguel Hachen, reconhecido por retratar a pluralidade cultural da região, também foi vítima da falta de estrutura técnica para a preservação do muro que lhe serviu de suporte. Sua derrubada significou não apenas a perda de uma obra de arte, mas também de um registro visual da identidade iguaçuense.

Miguel Hachen, com seu talento, eternizou em cores e formas as histórias e valores da cidade em suas obras. A destruição do painel representa um ataque à expressão artística e aos bens culturais imateriais que conectam gerações.

Esses episódios demonstram um padrão preocupante de falta de preparo teórico e técnico para preservação do patrimônio cultural em Foz do Iguaçu. É urgente que o poder público promova políticas de preservação, valorização e educação patrimonial.  

A ausência dessas políticas desencadeia o esquecimento e abre espaço para a descaracterização da cidade. É imperativo que haja incentivos à restauração, aos debates públicos e instrumentos legais eficientes para a preservação. Uma cidade sem memória é uma cidade oca e sem vida, sem identidades, sem senso de pertencimento e projeção de futuro.

Preservar o patrimônio cultural não é apenas um dever do Estado ou do Município, mas de toda a sociedade. É aqui que a educação patrimonial cumpre um papel decisivo.

O tombamento do GRESFI e o desenvolvimento da educação patrimonial pelo museólogo e historiador Pedro Louvain e estudantes da UNILA vem contribuindo para que centenas de crianças, jovens e adultos conheçam sua história cultural e natural estabelecendo relações com os povos guarani, a fauna e a flora da região.

Todos ganham. O turismo adquire a profundidade e a riqueza que só a memória pode construir. A parceria com a universidade pode fortalecer esse processo.

A memória coletiva forma a base das identidades e do pertencimento. A derrubada de prédios históricos, de monumentos e de obras de arte empobrece o imaginário social, reduzindo as possibilidades de diálogo entre passado, presente e futuro.

É imperativo que Foz do Iguaçu repense suas prioridades e promova ações efetivas para proteger sua história e cultura, garantindo que episódios como aqueles não se repitam e que a cidade permaneça viva em sua pluralidade e riqueza patrimonial. A população de Foz do Iguaçu merece conhecer e ter orgulho de seu passado.

Giane Lessa é professora da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila) e doutora em Memória e Patrimônio.

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