A família de José Werner chegou a Foz do Iguaçu em 1909, antes da oficialização da cidade, que ocorreria cinco anos depois. Trabalhou com Jorge Schimmelpfeng e Acácio Pedroso, foi prefeito, jogou no ABC e sobreviveu a um trágico acidente de navio nas águas da fronteira. O pioneiro concedeu uma entrevista épica ao jornal Nosso Tempo em 1981.
Para chegar à fronteira, contou, apenas a viagem de Ponta Grossa até Laranjeiras do Sul durou um mês, feita de carroça. Já de lá para cá, foi necessário abrir caminho na mata, levando mantimentos e roupas sobre o lombo de cavalos. Sem pontes, quando chovia os rios subiam e não dava para atravessar.
“A gente ficava esperando o rio baixar. Muitas vezes acabava a comida, e daí o negócio era comer palmito ou caçar”, relembrou. “Levava quatro ou cinco dias para se chegar a alguma casa, onde nos reabastecíamos”, contou, descrevendo a epopeia vivida pelos primeiros moradores da região.
Aos dez anos, foi estudar em Curitiba (PR), viajando de vapor até Posadas, na Argentina, e, de lá, seguindo um longo itinerário de trem até a Capital do Estado, onde concluiu o primário. Ao retornar, trabalhou no comércio do primeiro prefeito, Jorge Schimmelpfeng. “No primeiro ano não ganhei nada. Depois é que passei a receber um pequeno salário”, recordou.
Entre os produtos cultivados na vila estavam milho, feijão e arroz. Uma parte era consumida na cidade, enquanto que algo era enviado para a Argentina. Perguntado se Schimmelpfeng dirigia ou tinha motorista particular, respondeu que o principal agente público da época “era muito gordo e não podia dirigir. A barriga pegava na direção”.
Dr. Santos Dumont
A entrevista ao Nosso Tempo une reminiscências, história da cidade e bom humor. Ao responder quantas vezes se casou, José Werner disse que foram duas: “De manhã no civil e de tarde na igreja”. E sobre quantos anos esperava viver? “Na véspera da minha morte eu aviso vocês”. Ele faleceu aos 90 anos, em 1990.
Os bailes da antiga Foz do Iguaçu, relembrou, ocorriam principalmente para celebrar aniversários, animados com violão, harpa e gaita. E tinha até um inglês na banda — a charanga — chamado Jorge Samways.
— Me lembro que, quando chegou o Santos Dumont, a charanga foi lá no porto para recepcioná-lo. Ele veio da Argentina e desceu num vapor velho. O pessoal até dizia: ‘Pois é, Dr. Santos Dumont! Nóis esperava o senhor por riba, e o senhor veio por baixo!‘
O prefeito e o cemitério
Em 1931, José Werner foi designado prefeito, cargo que ocupou por pouco tempo. Assim que assumiu, Otto Marder pediu que fosse criado o cemitério, o que rendeu mais uma das boas histórias.
“Me lembro que disse a ele: ‘Mas, Otto, será que vou ter que inaugurar o cemitério? É uma lenda, né? Quem constrói cemitério logo morre e é o primeiro a inaugurar”, reproduziu. “Inclusive, quando o cemitério foi feito, mandei reservar uma cova pra mim. Mas hoje o cemitério está cheio, não cabe mais ninguém. E eu ainda estou aqui”, narrou, com bom humor.
A explosão do vapor
Em 1924, ao retornar de Curitiba, onde cumpria o serviço militar, José Werner estava a bordo do vapor Santa Cruz, que explodiu no Rio Paraná, matando cerca de 120 dos 150 passageiros, a maioria turistas a caminho da Argentina. O navio transportava seis tambores de gasolina, o que era proibido.
— Quando aconteceu a primeira explosão, eu estava perto da minha irmã. Ela se agarrou em mim, mas logo em seguida não vi mais nada, por causa das outras explosões. Quando me dei conta, estava no meio da água. Nadei até uma caixa e fiquei agarrado nela, enquanto a gasolina se espalhava por cima da água, e com ela o fogo. Parece mentira, mas sofri queimaduras graves. Até hoje tenho cicatrizes.
História de Foz a um clique
O portal Nosso Tempo Digital reúne todo o acervo do jornal, projeto lançado para marcar o aniversário de 30 anos do periódico rebelde. Assim, o objetivo é preservar a memória da cidade, facilitar o acesso à história local e regional, e democratizar a consulta ao acervo midiático por meio da internet.
O acesso é gratuito. O acervo constitui fonte valiosa para o morador desejoso de vasculhar a história da cidade e de seus atores, contada nas 387 edições do jornal que foram digitalizadas, abrangendo de dezembro de 1980 a dezembro de 1989.


