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Reportagem Especial

Argentinos cruzam a fronteira para comprar em Foz do Iguaçu

Com preços em alta no país vizinho, alguns itens de mercado e confecções ficam mais em conta no Brasil

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Argentinos cruzam a fronteira para comprar em Foz do Iguaçu
Família de Arlindo Flores frequenta supermercados em Foz: mais em conta. Foto: Marcos Labanca/H2Foz

Os argentinos voltaram a movimentar com mais frequência o comércio de Foz do Iguaçu, mesmo com a inflação desacelerando no outro lado da fronteira. Os supermercados são os campeões de preferência, mas os hermanos também aparecem na Vila Portes e nas lojas do centro em busca de roupas, sapatos e outros artigos.

Arlindo Flores, 61 anos; a esposa, Irene Zarate, 58 anos; e o filho Fernando Flores, 34 anos, vêm todos os meses para Foz do Iguaçu fazer compras. Moradora de Puerto Libertad, a 50 quilômetros da fronteira, a família gasta o equivalente a P$ 150 mil e leva uma quantidade de itens que seria impossível adquirir na Argentina.

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Os produtos que eles mais buscam são óleo, arroz, macarrão, azeitona e açúcar. Em geral, os preços estão cerca de 30% mais em conta. O alho, diz Arlindo, é quase P$ 2 mil a cabeça no país vizinho. No Brasil, um quilo custa cerca de P$ 8 mil. Para se ter uma ideia, P$ 1 mil argentinos correspondem a R$ 5,88.

Sobre a situação econômica no país, Arlindo afirma acreditar que vai melhorar em um ano. “Há que dar tempo”, enfatiza.

Queijos, azeitonas e doce de leite

Até mesmo produtos típicos da Argentina estão na lista dos compradores. Gerente do Amigão Supermercados, Wesley Rodrigues informa que a procura é grande por queijo, azeitona e doce de leite. O trio de alimentos está no rol dos mais cobiçados por brasileiros que visitam o país vizinho. 

Para atender a clientela, segundo Rodrigues, o supermercado vende queijo típico argentino. O gerente estima que hoje os vizinhos representem cerca de 15% do movimento da unidade, ou seja, entre 300 e 400 argentinos ao dia que circulam pelo estabelecimento. “O que mais impulsionou a vinda deles foi a inflação no lado de lá”, frisa.

O movimento começou a aquecer em fevereiro, e os itens mais procurados, conforme Rodrigues, são arroz parboilizado, biscoitos de chocolate e morango, cerveja escura, carne de porco e bovina.

Para se ter uma ideia, com os argentinos, a venda do arroz parboilizado aumentou em mais de 100%; a cerveja escura, 70%; o queijo muçarela, 40%; e doces, 30%.

Para Carlos, preços no Brasil são melhores. Foto: Marcos Labanca/H2Foz

Para agradar ainda mais aos clientes, foi criado o Clube Mais – que dá descontos em alguns produtos para argentinos e paraguaios. Para isso, o supermercado disponibilizou um sistema que aceita a documentação argentina, já que no Brasil o Clube Mais é feito mediante o CPF.

Calçados

Na Vila Portes, a saga dos argentinos é buscar roupas e principalmente sapatos e tênis. Eles dizem que no Brasil há mais variedade de calçados e de qualidade. Luiza Zacarías, 62 anos, mora em Puerto Iguazú e vem com frequência a Foz para comprar roupas e sapatos.

Luiza Zacarías diz que no Brasil há mais variedade e qualidade de calçados. Foto: Marcos Labanca/H2Foz

“No Brasil, tem mercadorias que só tem aqui. Há muita variedade. O argentino gosta do calçado porque tem qualidade”, ressalta. De acordo com ela, roupas e calçados custam cerca de 30% menos em Foz do Iguaçu.

Morador de Puerto Iguazú, Carlos Aramachyo, 40 anos, também costuma ir à Vila Portes para comprar tênis e roupas. Para ele, no Brasil o preço é melhor e há mais opções.

Comerciante na Vila Portes e proprietário da Casa Vitória, Laudelino Pacagnan confirma ter percebido mais movimentação de argentinos neste ano nas lojas. O valor gasto se manteve, porém a presença é maior, representando aproximadamente 10% a mais em relação ao ano passado.

Vila Portes é um dos bairros com presença de argentinos. Foto: Marcos Labanca/H2Foz

Inflação em queda não garante preços mais baixos

Professor dos cursos de Economia, Administração Pública e Políticas Públicas da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), Milton Moretto realça que a desaceleração da inflação na Argentina não impede o aumento de preços. “Os preços continuam aumentando, mas aumentam menos.”

Conforme Moretto, dados oficiais do INDEC (semelhante ao IBGE no Brasil) indicam que, em dezembro de 2023, a inflação foi de 25,5%; já em abril de 2024, o índice chegou a 8,8%, e em junho, caiu a 4,6%.

Moretto ressalta que, apesar de estar em queda, a inflação no país vizinho ainda é tida como alta. No período de janeiro a junho deste ano, os preços aumentaram em média 80%.

Ele lembra que o índice de preços ao consumidor é um valor médio. Por isso, alguns produtos aumentam mais que outros. Isso quer dizer que a inflação é diferente entre as pessoas. Para quem consome os produtos com maior elevação de preço a inflação acaba sendo pior.

Essa situação provavelmente faz os moradores da região fronteiriça procurarem Foz do Iguaçu para adquirir bens e produtos que hoje estão mais caros na Argentina. “Essas pessoas têm essa opção, o que a grande maioria da população argentina não tem”, reforça o professor.

Outro fator que atrai os vizinhos a Foz é o câmbio, atualmente mais favorável a eles. Moretto explica que a estratégia do governo argentino é usar o dólar como âncora de referência para a economia.

Isso tem feito os preços em moeda estadunidense aumentarem, encarecendo as viagens de brasileiros para a Argentina. Ao mesmo tempo, o real tem se desvalorizado frente ao dólar neste ano, e a moeda argentina se valorizou em relação ao real.

A elevação de preços no mercado argentino acaba deixando certos produtos brasileiros com valor atraente, embora seja importante frisar que não são todos. Para Moretto, a queda na renda de grande parte da população argentina faz com que os gastos com o consumo de produtos não essenciais diminuam.

Cota

Para ingressar na Argentina com mercadorias brasileiras ou de qualquer país do exterior, os argentinos precisam respeitar uma cota de US$ 300 por pessoa, sem finalidade comercial, o que inclui alimentos, roupas e calçados.

Mas para quem mora até cem quilômetros da fronteira, a cota é de US$ 50. É proibido ingressar no país com qualquer produto de origem animal e vegetal vindo do exterior. 

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    Denise Paro

    Denise Paro é jornalista pela UEL e doutoranda em Integração Contemporânea na América Latina. Atua há mais de duas décadas nas Três Fronteiras e tem experiência em reportagens especias. E-mail: deniseparo@h2foz.com.br