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Reportagem Especial

Uma década de atraso

Enquanto árvores caem, Foz espera seu plano de arborização

Para bióloga, instrumento poderia evitar “matança de árvores” na cidade; prefeitura diz que contratará empresa para revisão completa do plano.

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Enquanto árvores caem, Foz espera seu plano de arborização
No centro, trecho da Avenida JK em obras e árvores derrubadas – foto: Marcos Labanca/H2FOZ

Saúde, qualidade de vida, embelezamento da cidade, bem-estar, prevenção de enchentes e de alagamentos… E, sim, dinheiro que dá em árvores. Mesmo com tudo isso, Foz do Iguaçu continua sem implementar o Plano Municipal de Arborização Urbana, espera que completa dez anos, apenas considerando a versão elaborada em 2015 e que ainda não saiu do papel.

Em linha cronológica, a proposta de plano perpassa gestões de cinco prefeitos, efetivos ou tampões — Reni Pereira, Ivone Barufaldi, Inês Weizemann, Chico Brasileiro e, em exercício do mandato, Joaquim Silva e Luna. Com efeito, não há manejo adequado da vegetação e ocorre a supressão desenfreada.

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Bióloga e educadora ambiental, a professora universitária dra. Luciana Ribeiro defende que um plano de arborização adequado, construído com a participação da comunidade, poderia evitar a “matança de árvores” que considera ocorrer na cidade. Ela não vê desculpas para o atraso na sua implementação, que é uma obrigação legal dos municípios.

Em frente a um prédio público, o ipê-amarelo resiste à fiação – foto: Marcos Labanca

Esse documento permite o planejamento das políticas governamentais, atendendo às necessidades da cidade e respeitando as características das árvores. Define, por exemplo, época de plantio, espécies mais adequadas, tipos de cuidados e quais perfis técnicos devem ser exigidos dos agentes envolvidos nesse serviço.

“Do jeito que está sendo feito hoje, as plantas simplesmente vão sendo retiradas conforme os interesses diversos”, avalia. “Por motivos comerciais, imobiliários ou mesmo por alguém incomodado porque tem de varrer folhas ou porque caiu uma manga no carro. E assim por diante”, critica.

Atuante em projetos ambientais em Foz do Iguaçu, Luciana contextualiza que uma empresa chegou a ser contratada pelo município para operar o Plano de Arborização, mas terminou em judicialização. Para ela, a prefeitura já poderia ter licitado outra prestadora de serviço ou, ainda mais acertadamente, firmado parceria com universidades e organizações.

Luciana Ribeiro afirma que, se o Plano de Arborização fosse efetivado, teria potencial para nortear obras que atropelaram as árvores em Foz do Iguaçu, da Perimetral Leste à recente Avenida JK, bem como demais construções e expansões. Ela cita que árvores podem levar até 30 anos para chegar à vida adulta e que, em média, só 10% das mudas plantadas sobrevivem, ainda mais sem manejo e cuidado. Não é só derrubar uma árvore e plantar outra.

“É uma lástima: tanto tempo se passou sem que um novo plano tenha sido feito”, lamenta. “Falta um pouco mais de articulação e conhecimento para viabilizar coisas que, a princípio, são vistas como dificuldade”, aponta, ao citar que há instituições locais e nacionais que podem contribuir.

O que diz a prefeitura

À reportagem, a administração disse que o Plano de Arborização foi elaborado em 2015 e passou pela análise técnica do Centro de Apoio Operacional da Promotoria da Justiça (CAOP). Desde então, foram realizadas diversas correções. E que irá contratar uma empresa para a sua atualização.

“Considerando o significativo lapso temporal entre os dados coletados à época e a realidade atual, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente fará a contratação de uma empresa especializada para a reformulação completa do plano”, reportou a prefeitura. Conforme a gestão municipal, o processo está em fase de licitação.

“A nova versão será desenvolvida com o uso de tecnologias modernas e metodologias compatíveis com os avanços disponíveis, garantindo maior eficiência na gestão da arborização urbana”, declarou. “A expectativa é a de que o novo plano esteja concluído no próximo ano.”

Registro desta semana mostra uma árvore caída no trecho já concluído da Avenida JK – foto: Marcos Labanca

Às árvores, desesperadamente

A bióloga cita um sem-número de benefícios da arborização urbana. Primeiro, reduz elementos poluentes, já que captura gás carbônico e o transforma em matéria orgânica. “Ele sai da atmosfera e vira árvore, tronco, folha, raiz. Uma boa arborização reduz a poluição em 60%”, ressalta Luciana Ribeiro.

Os benefícios abrangem ainda:

  • redução da temperatura, especialmente nas ilhas de calor nos locais muito urbanizados;
  • prevenção de enchentes, com a água conseguindo entrar no solo, percorrendo os caminhos das raízes;
  • melhoria da qualidade do solo, devido à serapilheira — matéria orgânica que cai na terra;
  • combate à poluição sonora;
  • melhoria da condição biológica, atraindo pássaros e aves, por exemplo;
  • melhoria na saúde física e mental das pessoas.

E o dinheiro em árvores? De acordo com a docente e ativista ambiental, a arborização adequada da cidade geraria receitas por meio do ICMS Ecológico. O caixa também seria reforçado com a redução do gasto público, porque se reduziriam os efeitos de alagamentos e enchentes, além de haver menor dispêndio com sistemas de drenagem, calçadas e fiação.

Não é só. Por ser turística, com sua imagem vinculada à natureza, Foz do Iguaçu poderia aproveitar mais essa vocação fomentando o setor. “Além do direito do morador, turistas não só gostam de uma cidade arborizada, voltam e recomendam, permanecem mais tempo e têm outras coisas para dizer sobre a estada além dos pontos turísticos”, realçou.

Saúde e qualidade de vida

Pessoas se sentem bem perto de plantas, prossegue a professora. Além de sombra, estética e frutos, árvores apresentam propriedades que interagem com a saúde humana e trazem benefícios, por meio de óleos, odores e cores. “Árvore é antiestressante, antioxidante é desintoxicante”, pontua, enquanto o ambiente fechado é o contrário disso.

Mais uma poda que deixou a árvore forquilhada, na região do bairro Morumbi – foto: Marcos Labanca

Por isso, Luciana Ribeiro argumenta que as pessoas têm o direito a viver em uma cidade com ruas e praças arborizadas, bosques e outros espaços de acesso público e gratuito. Viver em ambientes fechados, sob ar condicionado e luz artificial, diz, provoca reações no organismo que causam envelhecimento precoce, estresse, mau humor, má qualidade do sono, entre outros problemas à saúde.

“Ao contrário disso, pessoas que convivem perto de árvore, vento e água são favorecidas, desestressam e melhoram a qualidade do sono, da digestão e do humor, por exemplo”, enumera. “É preciso conectar com a vida, não com as telas. A natureza oferece conforto, bem-estar e segurança, que são impagáveis.”

Plantas exóticas

Outro efeito da falta de plano de arborização são as plantas exóticas. É o caso dos ciprestes que foram plantados na Praça da Paz, no centro, os quais, segundo a prefeitura, são mudas plantadas no ano passado e retiradas da Avenida General Meira, devido a questões de segurança viária. “Essas mudas foram reaproveitadas e plantadas em diversos espaços públicos do município, como praças e canteiros, a exemplo da Praça da Paz, na região central da cidade”, expôs administração.

Após críticas, ciprestes na Praça da Paz foram retirados — a segunda remoção das mesmas plantas – fotos: Jackson Lima e Marcos Labanca

Plantados junto aos bancos da praça, os ciprestes acabaram sendo retirados. Segundo o município, desde o início do ano, a Diretoria de Praças, Parques e Jardins, vinculada à Secretaria de Meio Ambiente, plantou aproximadamente quatro mil mudas de espécies nativas. E que estão sendo realizados plantios na rotatória e parte do canteiro central da Avenida Costa e Silva, com flores das espécies lantana e tagete, conhecidas por sua resistência ao clima quente e à exposição solar intensa.

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    Paulo Bogler

    Paulo Bogler é repórter do H2FOZ. Com enfoque em pautas comunitárias, atua na cobertura de temas relacionados à cidade, política, cidadania, desenvolvimento e cultura local. Tem interesse em promover histórias, vozes e o cotidiano da população. E-mail: bogler@h2foz.com.br.

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