Cidades impermeabilizadas: caos aquático

O impacto do excesso de chuva na periferia, não é o mesmo em áreas nobres. E isso tem a ver com o descaso com a malha urbana

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Por AIDA FRANCO LIMA | OPINIÃO

Os eventos climáticos parecem a cada dia mais com os boletos. Eles batem à porta com cada vez mais frequência! Você já deve ter se sentido assim, há dias que nem dá vontade de ligar a televisão, escutar o rádio ou navegar pelos sites de notícias. É só tragédia! Fogo no Chile, terremoto em meio a um frio assustador na Turquia e Síria. Frio intenso nos EUA e chuvas torrenciais no Brasil, levando vidas e bens materiais. Melhor ir assistir alguma coisa que não nos faça pensar…

Mas não pensar, nas consequências das tomadas de decisões, parece ser uma regra e não a exceção, em se tratando de gestão pública. Olhe a seu redor. Está tudo impermeabilizado. O ser humano está criando barreiras onde não deve, sufocando a natureza, literalmente. Repare nos rios urbanos. A maior parte deles foi transformada em esgotos ou estão escondidos sob o asfalto.

Quando chove, a água precisa correr. E se não há leito de rio, ela corre por onde der. Não é que o rio invade além do leito. São as águas tomando os espaços sequestrados com o avanço da malha urbana. E a mata ciliar? Piada sem graça.

E então, quando chove e as tragédias parecem cenas reprisadas de um filme de horror, imputamos a culpa à quantidade exagerada de água que jorra dos céus. Porém, é importante lembrarmos que o problema em si não é o excesso de chuvas. Mas o local onde essas ocorrem. Já notaram que se o índice pluviométrico dobrar de quantidade, tida como normal, em um residencial no conceito de Alphaville uma tragédia é exceção e não regra? E por qual motivo o mesmo não ocorre nas periferias?

Não estamos evoluídos o suficiente para aprendermos com os erros… Não são apenas as grandes cidades, que cresceram sem um planejamento, que sofrem com as águas de março ou outros meses quaisquer. As pequenas, também. Em nome de ciclovias, estacionamentos, calçamentos. A praticidade em andar em pisos nivelados e compactados custa caro. Mais caro ainda aos mais pobres.

Nessa semana mais uma bebê de dois aninhos perdeu sua vida, quando o barraco de sua família desmoronou, na Chácara do Céu, na Zona Norte do Rio, na terça-feira (07). Um total de 113 vezes as sirenes ecoaram para alertar o perigo eminente. Quem tem o privilégio de morar em áreas seguras, imagina que sirenes são usadas em tempos de guerra. Mas aqui no Brasil, a guerra é diária.

Na Turquia e Síria, até o momento, são cerca de 12 mil vítimas fatais sob os escombros. Mas há uma sutil diferença entre os males que surgem do interior da terra e aquilo que estamos fazendo sobre ela. Os terremotos, por mais previsíveis, por mais que a engenharia avance, é algo para o qual o ser humano inevitavelmente pode sucumbir.

Mas morros deslizando e levando casas e vidas. Comunidades alagadas, tomadas de água, lama, lixo, esgoto e descaso é evitável, previsível. São situações que podem sim ser resolvidas. Mas para isso, os agentes públicos precisam querer. Porque nessas tragédias desenhadas anualmente só morrem anônimos, que viram apenas estatística.

E se as mudanças não acontecem porque quem tem a caneta não vivencia na pele os horrores da vida urbana, sem planejamento, as melhorias precisam brotar através da força da comunidade. Através das associações de moradores, grêmios estudantis, grupos religiosos, câmaras, redes sociais, o que for. O que não podemos é continuar aceitando que o papel principal das autoridades que deveriam pensar nossas cidades seja apenas soar um alarme. Como se estas não fizessem parte do problema. Com sua negligência, omissão, falta de inteligência ou má assessoria.

Este texto é de responsabilidade do autor/da autora e não reflete necessariamente a opinião do H2FOZ.

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