Por: Marcos Rodrigo Gonzalez
Esta apresentação busca refletir, sob a perspectiva da psicanálise freudiana e lacaniana, sobre como as relações de trabalho no capitalismo afetam os indivíduos em sociedades capitalistas. Com um enfoque nas questões sociais, o objetivo é analisar o papel do sujeito como trabalhador, produtor e consumidor, considerando os impactos psíquicos de sua interação com outros e com a cultura. É importante destacar que o capitalismo não é a única fonte de sofrimento humano, mas se destaca por distorcer relações de poder e sociais, gerando dinâmicas que merecem atenção.

Sigmund Freud, ao explorar temas como amor, ódio e religiosidade no início do século XX, também questionou os efeitos do trabalho no que chamou de “mal-estar na cultura”. Para ele, “nenhuma outra técnica de condução da vida liga tão fortemente o indivíduo à realidade quanto a ênfase no trabalho” (FREUD, 1930, p. 325). No entanto, Freud também observou que “a grande maioria dos seres humanos só trabalha obrigada pela necessidade, e dessa aversão natural dos seres humanos ao trabalho derivam os mais graves problemas sociais” (FREUD, 1930, p. 326). Desde tempos antigos, o trabalho surgiu como uma necessidade coletiva para garantir a sobrevivência, como cultivar alimentos, construir abrigos e proteger a comunidade. Essa origem funcional do trabalho torna essencial entender como o capitalismo transformou essas relações em algo que, muitas vezes, causa sofrimento.
Essa perspectiva pode ser conectada ao pensamento de Karl Marx, como destacado por Grespan (2021), que desenvolveu o conceito de “materialismo histórico”, que se trata da percepção da sociedade a partir do que é material, podendo ser relações materiais e condições de produção. Marx via as relações de trabalho, comércio e posse dos meios de produção como reflexos da luta humana pela sobrevivência. No entanto, com o avanço do capitalismo, essas relações passaram a gerar exploração e alienação. Os trabalhadores, que vendem sua força de trabalho no mercado, frequentemente se veem desconectados do produto de seu esforço, transformando o trabalho em uma fonte de sofrimento. Essa exploração é mantida porque os trabalhadores precisam se submeter ao sistema para garantir condições básicas de vida, como moradia e alimentação, mesmo que isso custe seu tempo, energia e bem-estar.
Paul Lafargue (2016) aprofunda essa crítica ao apontar que o trabalho foi elevado a um status “sagrado” por figuras como sacerdotes, economistas e moralistas. Essa sacralização serve para evitar questionamentos e manter a classe trabalhadora focada na produção, mesmo que isso signifique esgotamento físico e mental. A ideia de que o trabalho é intocável impede reflexões críticas sobre suas condições e reforça a submissão ao sistema capitalista. Jacques Lacan, em seu seminário “O Avesso da Psicanálise” (1970), oferece uma leitura complementar ao descrever o capitalismo como o “discurso do senhor moderno”. Nesse discurso, o Mercado assume o papel central, e o saber do trabalhador é apropriado pelo capital, tornando-se inútil para quem o produz. O trabalhador é explorado por aqueles que detêm o poder — os capitalistas —, que utilizam sua força de trabalho para acumular lucro.
A sacralização do trabalho também está ligada à valorização dos objetos de consumo, que são apresentados como capazes de satisfazer necessidades e aliviar angústias. Freud, em O Mal-estar na Cultura (1930), sugere que os seres humanos criam figuras poderosas, como deuses, para lidar com o desamparo. No capitalismo, o “deus Mercado” ocupa esse lugar, e os produtos de consumo são tratados como totens, prometendo poder, segurança e realização. Em Totem e Tabu (1913), Freud explica que os grupos totêmicos atribuíam aos animais sagrados a capacidade de protegê-los contra forças desconhecidas. No contexto capitalista, os consumidores agem de forma semelhante, buscando nos objetos de consumo a ilusão de preencher suas faltas e aplacar suas angústias.
Essa dinâmica de consumo, no entanto, também gera exclusão. Aqueles que não se encaixam no sistema capitalista — como pessoas pobres, marginalizadas ou consideradas incapazes — são marginalizados. Freud, em Psicologia das Massas e Análise do Eu (1921), mostra como a exclusão de certos indivíduos reforça a coesão do grupo que adere ao sistema. Os marginalizados tornam-se os portadores da “inutilidade” que o capitalismo rejeita, enquanto os que se conformam permanecem unidos pelo ideal do Mercado. Erving Goffman (2013) complementa essa ideia ao descrever instituições como manicômios, prisões e conventos como locais para onde são enviados aqueles que não contribuem para a lógica capitalista. Esses espaços, muitas vezes isolados ou murados, refletem a tentativa de esconder e reprimir os que não se adequam, mantendo a ordem estabelecida.
O filósofo Nuccio Ordine (2016) argumenta que, no capitalismo, tudo que não gera lucro é considerado inútil. A arte, por exemplo, é frequentemente reduzida a um hobby ou a uma “válvula de escape”. No entanto, Freud, em Três Ensaios sobre a Sexualidade (1905/2016), destaca a sublimação como um mecanismo valioso, pelo qual as pulsões são expressas de forma socialmente aceita, como na criação artística. Enquanto a psicanálise valoriza a sublimação, o capitalismo a perverte, transformando a arte em mercadoria. Essa lógica de transformar tudo em produto para lucro desvaloriza o potencial da arte como expressão humana e reforça a ideia de que só o que é lucrativo tem valor.
Zygmunt Bauman (2010) oferece uma metáfora poderosa ao comparar o capitalismo a um parasita que consome seus hospedeiros — tanto os recursos naturais quanto os trabalhadores. Essa exploração leva à exaustão física e mental, já que as demandas do sistema nunca são satisfeitas. Essa visão ressoa com a análise de Freud (1930) sobre o mal-estar na cultura, onde o sofrimento surge do corpo, do mundo externo e das relações sociais. No capitalismo, a lógica de trabalhar, produzir e consumir é incessante, alimentada pelas angústias humanas. Marx (1867) define a mercadoria como objetos que atendem às necessidades, sejam físicas ou imaginárias. No entanto, no capitalismo, a própria exploração e a necessidade se tornam mercadorias, perpetuando o ciclo de produção e consumo.
Freud (1930) reconhece que o sofrimento humano não desaparecerá com o fim do capitalismo, pois ele é apenas uma das formas pelas quais as pulsões se manifestam. No entanto, a psicanálise tem um papel crucial ao investigar como as relações sociais moldadas pelo capitalismo afetam a psique. Compreender essas dinâmicas permite identificar as formas que o sofrimento assume e buscar maneiras de aliviar as angústias geradas pela vida em sociedade. A exploração no capitalismo, ao transformar o trabalho em uma fonte de alienação e o consumo em uma falsa promessa de realização, intensifica o mal-estar descrito por Freud.

A psicanálise, ao se debruçar sobre o sujeito no contexto capitalista, oferece ferramentas para questionar a lógica do Mercado e seus efeitos. Ela nos convida a refletir sobre como o trabalho, que poderia ser uma expressão de criatividade e colaboração, é frequentemente reduzido a uma obrigação alienante. Além disso, a psicanálise destaca a importância de reconhecer as angústias humanas sem sucumbir à ilusão de que o consumo pode resolvê-las. Ao analisar o sujeito como parte de um sistema maior, ela nos ajuda a enxergar os mecanismos de exclusão, exploração e alienação que sustentam o capitalismo.
Por fim, é fundamental que a psicanálise continue explorando as relações entre o inconsciente e a cultura capitalista. Ao compreender como as pulsões se manifestam no trabalho, no consumo e nas relações sociais, podemos encontrar caminhos para lidar com o sofrimento que o sistema impõe. A crítica ao capitalismo, sob a lente da psicanálise, não busca apenas apontar problemas, mas também abrir espaço para reflexões que promovam uma relação mais consciente com o trabalho, com os outros e consigo mesmo. Assim, a psicanálise se posiciona como uma ferramenta de resistência às perversões do capitalismo, oferecendo uma perspectiva única sobre o sujeito e seu lugar no mundo.
Autor: Marcos Rodrigo Gonzalez
Convite Especial: Café Filosófico
Reflexões para Pais e Filhos

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Esperamos você e sua família!
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