A entrada de smarthphones do Paraguai pelas fronteiras brasileiras disparou nos últimos anos. Levantamento da Receita Federal do Brasil (RFB) feito a pedido do H2FOZ revela que, somente nos cinco primeiros meses de 2025, as apreensões dos aparelhos cresceram 25% em todo o país.
De janeiro a maio de 2024, os servidores apreenderam o equivalente a R$ 180 milhões em smartphones. Neste ano, o valor retido no mesmo período corresponde a cerca de R$ 224 milhões, um aumento de 23,9%.
A Receita Federal estima que cerca de dez mil celulares entrem no Brasil todos os dias. Se for considerado o valor médio de US$ 200 de cada aparelho, somado ao fato de, nos primeiros 150 dias de 2025, mais de um milhão de celulares terem entrado no país ilegalmente, tem-se a cifra superior a R$ 1,1 bilhão movimentados nos primeiros cinco meses do ano.
Smarthpones do Paraguai
A importação de smartphones pelo Paraguai é um termômetro do comércio do produto no Brasil. De acordo com dados da Direção Nacional de Ingressos Tributários (DNIT), do Paraguai, em 2023 as importações atingiram o patamar de US$ 3.037 milhões, valor que representa um salto de 212% em relação ao ano de 2022.
Foram importados aproximadamente 18 milhões de aparelhos, uma das quantidades mais altas dos últimos seis anos.
Com uma população de 6,4 milhões de habitantes, o Paraguai adquire uma fatia ínfima do produto. A maior parte é direcionada ao comércio de importados de Ciudad del Este, Pedro Juan Caballero e Salto del Guairá, para depois abastecer o Brasil e outros países sul-americanos.

Para o delegado-adjunto da Receita Federal do Brasil, Cláudio Marques, há duas situações fundamentais ao aumento da entrada de celulares no Brasil: o preço atrativo e o porte pequeno da mercadoria, que é fácil de transportar e camuflar.
Marques avalia que a movimentação de celulares pela fronteira segue a lógica do crime organizado. “Passam em pequenas quantidades e distribuem para o resto do Brasil”, frisa. A entrada de quatro a cinco celulares no país já tem um alto valor agregado, relata.
Em Foz do Iguaçu, a fiscalização alfandegária estima que apenas 3% do que passa pela fronteira seja retido.
Artimanhas para driblar fiscalização
Inúmeras artimanhas são usadas pela rede do contrabando e descaminho para passar os celulares pela fiscalização fronteiriça sem prejuízo de perda.
Esconder aparelhos dentro de outros produtos é comum. Os servidores da RFB já encontraram celular em robôs de limpeza e capacetes, por exemplo. Somente com um motoqueiro, os fiscais apreenderam o equivalente a R$ 414 mil em celulares.

Para tentar enganar os servidores, os infratores utilizam embalagens de outras mercadorias para guardar os aparelhos, que muitas vezes são transportados sem as caixas.
Porém, isso não significa que o produto é entregue no destino sem a embalagem. As caixas são levadas ao Brasil para os aparelhos serem novamente embalados.
Recentemente, um morador de Foz do Iguaçu foi flagrado com quase 2 mil celulares escondidos em barris de chope vazios. A carga era equivalente a R$ 2,9 milhões.
Em outra apreensão, em abril deste ano, mais de 2 mil celulares foram encontrados escondidos dentro do caminhão da companhia de energia elétrica do Paraná. A mercadoria foi avaliada em R$ 1,7 milhão.
Os smartphones mais apreendidos são de fabricação chinesa, especialmente da marca Xiaomi, com destaque para o Poco. Mas também é comum a interceptação de carregamentos expressivos de iPhones. Já aparelhos da marca Samsung dificilmente são apreendidos.
A prática de transporte dos celulares pelas fronteiras envolve diversos perfis de pessoas. Até mesmo estudantes de medicina já foram flagrados trazendo o produto do Paraguai para o Brasil.
Motos são motor do contrabando
Em meio ao mar de veículos e pedestres que cruza diariamente a Ponte Internacional da Amizade, entre Brasil e Paraguai, as motocicletas sobressaem quando o assunto é contrabando e descaminho.
Segundo a RFB, cerca de 20 mil motos cruzam ao dia a aduana entre Brasil e Paraguai. As motocicletas se misturam a outros 45 mil veículos e aproximadamente 103 mil pessoas que passam diariamente pela fronteira mais movimentada do Brasil.

De janeiro a maio deste ano, os servidores da RFB apreenderam 82 motos com fundos falsos na alfândega brasileira da ponte. Considerando que o valor médio dos smartphones, de variadas marcas, é US$ 200, o montante transportado via motos foi de R$ 84 milhões em mercadorias ilegais.
A equipe de fiscalização calcula que cada uma das 82 motocicletas apreendidas tenha cruzado, em média, a fronteira por 80 vezes antes de ser interceptada. Considerando as idas e vindas, estima-se que elas inseriram no lado brasileiro cerca de 75 mil celulares entre janeiro e maio.
Riscos aos consumidores
Presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (IDESF), Luciano Stremel Barros realça que a entrada de smartphones adquiridos do Paraguai traz prejuízos ao Brasil e aos consumidores.
“Muitos desses aparelhos não são homologados no Brasil e têm sérios riscos de proteção de dados e possibilidade de ter um software malicioso que pode acessar senhas e expor os usuários”, frisa.
O crime de inserção de celulares no Brasil para fins comerciais se enquadra no descaminho, porém Barros considera a ilegalidade como contrabando, quando o aparelho não é homologado pela Anatel.
Dados do IDESF de 2016 a 2019 já indicavam a escalada na entrada de celulares do Paraguai no Brasil. Em 2016, passaram pelas fronteiras 12.969.880 aparelhos; já em 2019, o número pulou para 13 milhões de unidades.
Na avaliação de Barros, todo o movimento de produtos ilegais acaba culminando no crime organizado, que distribui as mercadorias em grandes centros com logística sofisticada.
Para ele, é necessária uma postura da diplomacia brasileira em relação ao Paraguai, para o país importar menos certos tipos de produtos, tais como cigarros, celulares e eletrônicos, que acabam tendo como destino principal o Brasil.
Smarthpones do Paraguai – Balanço das apreensões
- Foz do Iguaçu
Janeiro a dezembro de 2024: R$ 112.399.851,37
Janeiro a maio de 2024: R$ 45.806.466,93
Janeiro a maio de 2025: R$ 49.380.632,51
Aumento de 7,8% entre maio de 2024 a maio de 2025.
- Paraná
Janeiro a dezembro de 2024: R$ 262.415.024,65
Janeiro a maio de 2024: R$ 93.944.515,34
Janeiro a maio de 2025: R$ 103.878.910,04
Aumento de 10,6% entre maio de 2024 e maio de 2025
- Brasil
Janeiro a dezembro de 2024: R$ 527.190.154,97
Janeiro a maio de 2024: R$ 180.700.578,35
Janeiro a maio de 2025: R$ 223.939.700,33
Aumento de 23,9% entre maio de 2024 a maio de 2025
Fonte: Receita Federal


