Familiares, defensores dos direitos humanos e amigos de Ismael Moray Flores promoveram ato simbólico nesta quarta-feira, 9, para cobrar júri popular aos dois policiais militares acusados da morte do jovem, em 2023, na região do Porto Meira, em Foz do Iguaçu, quando ele tinha 19 anos. A manifestação se concentrou no shopping em que a vítima trabalhava como atendente, com a entrega de panfletos e diálogo com a comunidade.
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Na noite de 27 de abril, Ismael voltava da casa da mãe quando presenciou uma abordagem policial a dois suspeitos de assalto em uma motocicleta. Desarmado, ele foi morto na Rua Ágata, onde morava. Junto com ele, também morreu João Carlos dos Santos, de 34 anos, apontado como um dos suspeitos que teria fugido da ocorrência. Os óbitos ocorreram às 23h30, segundo o obituário do município.
Na época, sete integrantes da corporação foram afastados pelo comando da Polícia Militar do Paraná (PMPR), com dois deles virando réus, a pedido do Ministério Público do Paraná: o sargento Daniel Barcellos e o soldado Emerson Gonçalves — os demais não foram denunciados. À imprensa, porta-voz da PMPR reconheceu que o jovem morto não estava armado.
Ismael Flores
Mãe de Ismael, Clair Alves Fernandes Moray (40) expôs que o protesto é para cobrar celeridade no desfecho do caso. E para reforçar o pediddo para que os dois réus sejam levados a júri popular, para julgamento da sociedade, como forma de se fazer justiça.
“Foi uma execução, sem sombra de dúvidas”, opinou, sobre as circunstâncias da morte do filho. “Teve testemunha que ouviu meu filho gritar: ‘Não sou ladrão, não me mate, por favor’”, relatou ao H2FOZ. Ela espera que a audiência marcada para a tarde desta quarta-feira encerre a fase atual, para que seja marcado o julgamento.
“Meu filho só trabalhava. Era uma benção. Os policiais tiveram a oportunidade, a chance de não matá-lo quando ele implorou pela vida”, disse Clair. “Meu pedido é por justiça para meu filho e para que isso não volte a se repetir”, salientou.
Outro lado
A defesa dos dois policiais sustenta que eles agiram em legítima defesa. O homem suspeito de assalto, que aparece em imagens de câmeras das ruas fugindo, teria feito menção de atirar na polícia, ocorrendo o revide. Era uma noite de névoa, de pouca visibilidade, adiciona. Os registros não captaram o momento em que aconteceram as duas mortes.

Movimentos do processo
A reportagem apurou que a audiência para ouvir testemunhas, que era para acontecer em dezembro do ano passado, foi redesignada para 29 de janeiro. Nela, foram ouvidos a mãe e o ex-companheiro de Ismael, assim com as testemunhas de acusação Giovane Valenga, Mateus Queiroz, Alexandre Fontes e Wanderson Pedrini.
A audiência foi estendia para 9 de brasil. Assim, foram ouvidas a testemunha de acusação Anderson dos Santos e as testemunhas de defesa dos réus, Flavio Marczak e Irlan dos Santos Lucas Martines — ouve a desistência da oitiva de Vilmar Bordinhão. A sequência dos depoimentos foi marcada para esta quarta-feira, para serem ouvidos:
- Irlan dos Santos;
- Marcos Aurélio Lopez (testemunha de defesa, para esclarecer pontos do seu parecer técnico);
- capitão Murilo Mendonça Mendes (testemunha de defesa);
- coronel Péricles de Matos (testemunha de defesa);
- sargento Genésio Oliveira (testemunha de defesa);
- Marco Berzoini Smith (testemunha de defesa);
- Tania Cani (testemunha de defesa);
- Elias Magalhães (testemunha de defesa);
- Moises Geraldo (testemunha de defesa); e
- interrogatórios de réus.
Confrontos policiais
O H2FOZ revelou que Foz do Iguaçu foi a terceira cidade do Paraná com mais mortos nos — assim chamados pelos órgãos de segurança — confrontos policiais, em 2024. Foram registradas 15 ocorrências dessa natureza na cidade, conforme a reportagem, a partir de dados do Ministério Público do Paraná (MPPR).
No ano em que Ismael Moray Flores foi morto, 2023, houve 13 mortes nesse tipo de situação, com a cidade também figurando na terceira posição. Em geral, são casos catalogadas como mortes em confronto, com as vítimas preenchendo estatísticas e obituários, e os familiares pedindo apuração efetiva e responsabilização, em muitos casos.
O Paraná engatinha na adoção de câmeras corporais para suas polícias. Em maio, o Governo do Estado anunciou que irá testar câmeras corporais de alta tecnologia, com inteligência artificial e tradução simultânea, contemplando 50 dispositivos usados experimentalmente em Curitiba e Foz do Iguaçu.
Diferentes pesquisas depõem que a aplicação do equipamento em fardas reduz a letalidade policial e as mortes de agentes da segurança pública, entre outros indicadores.
O Ministério da Justiça e Segurança lançou, ano passado, o documento Câmeras Corporais: Uma Revisão Documental e Bibliográfica, de autoria do consultor Pedro Souza, professor de Economia da universidade Queen Mary, de Londres. O documento, baseado em evidências e na aplicação em mais de 40 países, objetiva subsidiar a formulação de políticas públicas nos estados e municípios.
O uso das câmeras corporais ao redor do mundo indica melhora no desempenho das polícias e em seu relacionamento com a sociedade, sustentou o especialista. Para ele, contribuíram para a redução da letalidade policial. No caso da Polícia Militar (PM) de São Paulo, o estudo revela que o “efeito câmera corporal” reduziu em 57% a letalidade contra a população negra.
Em outro estudo, do Unicef, órgão das Nações Unidas, citando levantamento do Instituto Sou da Paz, comparando a atividade policial antes (2018 e 2019) e depois (2021 e 2022) do programa de monitoramento em São Paulo, as câmeras foram responsáveis pela queda de 46% da letalidade entre adolescentes e jovens de 15 a 24 anos. E houve queda da vitimização de policiais.