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Filosofia

Comércio Matrimonial

Professor Caverna convida André Marques para refletir sobre casamento.

7 min de leitura
Comércio Matrimonial

Por André Marques

“O casamento é geralmente considerado como a iniciação do mancebo na realidade da vida. Ele prepara a família, a maior e mais séria de todas as responsabilidades”. José de Alencar, em Senhora.

Acabei de ler ‘Senhora’ de José de Alencar. É o primeiro livro que leio desse autor.

Em primeiro lugar, a linguagem utilizada impressionou-me bastante. Bem diversa do que estou habituado – Graciliano Ramos, Erico Veríssimo, Machado etc., o autor consegue descrever os acontecimentos com uma graciosidade, suavidade e beleza que muito me impressionaram. Toda a obra é graciosa e bela, como a personagem principal, Aurélia. É incrível o modo como é descrita cada cena em que Aurélia aparece, as comparações com símbolos como a rosa, a rosa noturna, a própria noite. Ela é dona duma dualidade, por vezes luz do sol, dominando o ambiente de modo brilhante, outras é a luz da lua, ou a rosa noturna, guardando as reservas de luz solar para perfumar a noite, mais singela, mais tímida, mas cheia de graça.

A linguagem adotada é perfeita para descrever esta personagem. De igual modo no que concerne ao tema: Casamento.

Mas, o casamento no mundo moderno, que já não é mais casamento, é antes comércio.

Seixas, por quem Aurélia apaixona-se, é um homem forjado pela sociedade. Imerso em toda a sorte de vícios de convívio e requintes da alta sociedade fluminense. Vaidoso, covarde, voltado à aparência, superficial num certo sentido.

Os dois apaixonam-se um pelo outro. É o único homem a quem Aurélia entrega seu coração.

Ela era órfã de pai, seu irmão morrera e a mãe não demoraria muito neste mundo, doente que estava. Foi forçada pela última a ficar à janela a ver se arranjava um bom partido. Foi exposta à vitrine. A jovem e bela Aurélia era cortejada e admirada por uma turba de homens interessados em usufruir de sua beleza. Alguns também queriam, verdade, casar-se. No entanto, a moça detestava este costume da sociedade. Casar por interesse a enojava.

Até que conheceu Seixas, por quem se apaixonou. Iniciaram um noivado. Mas, homem do mundo que era, Seixas temia e repugnava a pobreza. Aurélia era pobre. Acabou por procurar outra noiva, abandonando a pobre menina, que não demorou perder também a mãe.

Por sorte do destino, a menina acabou por receber uma imensa fortuna de seu avô paterno, até então desconhecido. Ficou muito rica!

Utilizou-se do dinheiro que agora tinha para pisar na sociedade. Tornou-se orgulhosa para não mais sofrer. Brincava, altiva, com os sentimentos dos homens, os quais via aproximavam-se de si por interesse.

Aconteceu que Aurélia fez uma aposta. Tomou uma decisão que decidiria toda a sua vida: Por intermédio dum tio, entregou uma proposta a Seixas, que estava endividado, e esquivando-se de casar com sua atual noiva; desde que o tio não revelasse se tratar dela, Aurélia, deveria oferecer um dote abastado e a promessa duma fortuna. Seixas, recebendo a oferta aceitou, embora sem saber quem fosse a moça com quem casaria. Humilhado pela situação em que estava, afinal estava vendendo-se, alegrou-se quando viu que Aurélia é quem seria sua mulher.

Seixas ainda a amava, o problema é que temia mais a pobreza e o afastamento da sociedade.

O noivado foi florido e feliz ao mancebo. Mas no dia das núpcias, a moça revela a que veio; ele não a possui. Passa a ser humilhado por um sarcasmo demoníaco diariamente. É apenas um traste da ‘senhora’. Talvez menos que um escravo.

A situação exige que Seixas tome uma decisão, a de não vender sua honra. Passa a fazer economias, usa somente do que já era seu antes do casamento, trabalha, mesmo sendo rico, anda a pé, abre mão da vida de luxo, tudo para comprar sua alforria.

Com muita resignação e paciência, ao fim ele consegue, graças a um negócio antigo que lhe dá um bom lucro.

Mas, o interessante de tudo, antes mesmo de Seixas ter a quantia para comprar sua liberdade, é que em vários momentos vemos uma inclinação, tanto de Seixas quanto de Aurélia um para o outro. Ambos se amam imensamente, mas Seixas é para Aurélia apenas um esboço do homem que fora antes, daquele que ela possuía em sua ideia, era um esboço que ofendia a honra do Seixas de Aurélia; se ele subisse um pouco que fosse em honra e dignidade, ela se entregaria. Do mesmo modo, Seixas ainda ama, sempre amou a moça, mas ela mostra-se diabólica e sarcástica, o rapaz sofre uma constante e sádica tortura moral, diariamente. Se ela voltasse a ser sua Aurélia…

Ao fim, Seixas vai comprar sua liberdade. Devolve todo o dinheiro do dote, tudo o que gastou, juros etc. Aurélia o liberta. Impressiona-se com a mudança que se operou em Seixas. Ele não era mais o homem de antes. Percebera que não valia de nada estar em meio ao luxo, sendo este adquirido às custas de sua alma. Este era o que a quase totalidade da sociedade da época entendia por casamento. Seixas percebeu, às custas de muito sofrimento, que não passava de comércio.

Aurélia comoveu-se.

Houve um longo caminho, foi pago o preço, houve a quitação e a posse do objeto comprado, agora o momento do resgate. Quando Seixas passa a não mais ser posse da ‘senhora’, ela deixa de ser sua dona, e se entrega, agora ao marido.

O livro tem um final feliz. Felizmente, porque enquanto o lemos, torcemos para que os dois deem certo. Torcemos para que deixem o orgulho e a altivez de lado, para que abram mão de si e se entreguem um ao outro. E ao final é o que ocorre.

Toda a obra retrata a degradação em que se encontra o casamento. Este não passa realmente de comércio, transpassado por interesses e caprichos. Visa a servir à sociedade corrompida da época. Suprime as vontades individuas de ambos os envolvidos, os faz enquadrarem-se numa espécie de teatro frio e amargo. Não há felicidade, não há a instalação na realidade que o casamento deveria proporcionar, este está reduzido a uma função social apenas. Perdeu todo seu valor. E quando um homem entra neste comércio, perde sua alma, sua honra, torna-se incapaz de amar verdadeiramente outra pessoa. A isto é que o casamento estava reduzido, já no tempo do império.

O matrimônio pode, desse modo, ser casto e levar o homem à plenitude, talvez à santidade. Mas, se corrompido por interesses, ou qualquer outra questão temporal que o diminui, só poderá levar o homem à humilhação, à perdição. O matrimônio pode salvar as almas, unindo-as, ou aniquilá-las.

Convite Especial: Café Filosófico

Reflexões para Pais e Filhos


Prezadas famílias!
Temos o prazer de convidá-los para o V Café Filosófico, um encontro especial onde pais e filhos poderão compartilhar um momento de reflexão e diálogo sobre os dilemas da vida.


Em um mundo repleto de desafios e mudanças constantes, criar espaços para conversas significativas fortalece os laços familiares e amplia nossa visão de mundo. Neste evento, vamos explorar juntos questões que nos fazem pensar, crescer e nos conectar de maneira mais profunda.


Por que participar?
✔ Fortaleça a relação com seu filho(a) por meio do diálogo
✔ Reflita sobre valores, escolhas e desafios da vida
✔ Compartilhe ideias em um ambiente acolhedor e inspirador

Data e local: Zeppelin

Contaremos com um ambiente descontraído e um delicioso café para tornar este momento ainda mais especial!
Venha viver essa experiência enriquecedora conosco! Sua presença fará toda a diferença.
Esperamos você e sua família!

Ingressos para o V Café Filosófico:

https://cafefilosoficoo.lojavirtualnuvem.com.br/produtos/1-lote-ingressos

Comunidade do “Café Filosófico” no WHATSAPP:

https://chat.whatsapp.com/Ewehn3zxEBr6U0z96uZllP

Obs. Caro leitor, o objetivo aqui é estimular a sua reflexão filosófica, nada mais! mais nada!

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Assuntos

Professor Caverna

Caverna é professor de Filosofia, criador de conteúdo digital e coordenador do projeto “Café Filosófico” em Foz do Iguaçu.