Cerca de cem crianças do CMEI Celeste Sotto Maior, no Jardim Paraná, poderão ser transferidas pela prefeitura para o antigo prédio, que teve a estrutura considerada “caótica” pela Secretaria Municipal de Educação (Smed), quando foi desativado em 2021. Pais e mães souberam da medida no momento da rematrícula e se mobilizaram para evitar a mudança.
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A prefeitura argumenta que a transferência faz parte de um planejamento iniciado em março e que o antigo prédio passa por reforma completa (veja abaixo). Já os responsáveis pelos pequenos afirmam que a decisão fere direitos das crianças e impacta o processo pedagógico. Eles iniciaram um abaixo-assinado com adesão da comunidade escolar, além de outras ações.
Entre os questionamentos está o que consideram falta de planejamento, transparência e diálogo por parte da Smed. Também apontam problemas nas condições estruturais da antiga unidade, que sofria com infiltrações e falta de segurança, agora indicada para receber crianças de 4 a 6 anos a partir do início de 2026.
Os pais lembram que o prédio atual do CMEI Celeste Sotto Maior foi construído em resposta às demandas da comunidade por melhorias e inaugurado em 2021. “O antigo sofria constantemente com goteiras e infiltrações em razão das chuvas, invasões para roubo de fios e materiais, com problemas estruturais que paliativos não resolviam”, pontua um dos pais que conversaram com a reportagem.
“Agora, depois de quase cinco anos de abandono, a estrutura está ainda mais deteriorada, recebendo apenas reparos e pequenas melhorias”, expõe. “Porém, seguem sem prazos a instalação de brinquedos ou a construção de um espaço com cobertura para que as crianças possam brincar e desenvolver atividades externas, isto é, que contemple os aspectos educativos, sociais e físicos das crianças. E não é uma edificação segura, com muros baixos — levemente elevados agora —, mas ainda com outras vulnerabilidades”, elenca.
A preocupação com as condições do prédio é fundada. Isso porque, na ocasião da inauguração da nova unidade, quatro anos atrás, usada atualmente, a então diretora de Educação Infantil da Secretaria de Educação afirmou que as crianças deixariam “para trás uma realidade de atendimento caótica, até insalubre, para desfrutar de um espaço capaz de oferecer muitas possibilidades”.
Processo educativo
No abaixo-assinado (na íntegra abaixo), pais e mães citam a Lei de Diretrizes e Bases da Educação como garantidora do direito de irmãos estudarem na mesma instituição de educação básica. “Além disso, muitas crianças desta comunidade já estão adaptadas ao espaço físico, às rotinas e às equipes do CMEI, inclusive crianças neurodivergentes (autistas, TDAH), para as quais mudanças bruscas e sucessivas de ambiente podem gerar crises emocionais e prejuízos pedagógicos”, argumenta o documento.

O texto alerta para riscos ao processo educativo. “Submeter uma criança de 4 ou 5 anos a duas quebras de ambiente em sequência não é pedagogicamente justificável. Isso vale especialmente para crianças neurodivergentes, mas não só. A previsibilidade cotidiana — chegar ao mesmo portão, ver as mesmas paredes, encontrar os mesmos adultos — faz parte do próprio processo de alfabetização emocional da criança nessa faixa etária”, destaca a reivindicação.
Outro lado
Ao H2FOZ, a prefeitura afirma que a medida faz parte de um planejamento iniciado em março, mesma data em que começaram as benfeitorias no antigo prédio, que passa por reforma completa para receber 90 alunos das turmas do Infantil 4 e 5. Ainda, alega que a comunicação aos pais só ocorreu na rematrícula por ser o momento em que novas gestoras estariam atendendo as famílias individualmente, a fim de explicar o remanejamento.
“O motivo é que o prédio antigo está passando por reforma e pela estrutura ele só pode atender alunos de Infantil 4 e 5”, salienta. A administração municipal diz que a previsão de transferência das crianças se deu de forma transparente. “A atual gestão do CMEI Celeste acompanhou o processo de reforma e apontou todas as melhorias que deveriam ser feitas”, lê-se na nota da prefeitura.
A reforma da antiga estrutura do CMEI Celeste Sotto Maior, prevista para terminar em 1.º de dezembro(*), segundo a administração, inclui:
- troca da rede elétrica;
- substituição de todas as portas e janelas;
- construção de banheiro para PcD;
- substituição do telhado;
- reforma completa da cozinha e dos banheiros;
- pintura total do prédio;
- aumento da altura do muro e instalação de grades de proteção nas janelas.
*No local da obra, a reportagem apurou que a reforma será concluída no fim da próxima semana, diferentemente da data informada pela prefeitura.
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Íntegra do abaixo-assinado
À Senhora Secretária Municipal de Educação de Foz do Iguaçu
Assunto: Solicitação para manter as turmas de Infantil 5 no CMEI Celeste Sottomaior.
Nós, pais, mães e responsáveis legais das crianças atualmente matriculadas no CMEI Celeste Sottomaior, vimos, respeitosamente, requerer a adoção de providências administrativas para manter as turmas de Infantil 5 nesta mesma unidade para os próximos anos letivos, em respeito a legislação vigente, pelos fundamentos pedagógicos, familiares, de inclusão e motivações legais que seguem.
- Exposição da situação
A manutenção das turmas de Infantil 5 no CMEI Celeste Sottomaior é necessária para garantir direitos das crianças que são expressamente reconhecidos na legislação vigente. A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelecem que os direitos das crianças têm prioridade absoluta e devem ser protegidos pelo poder público, assegurando seu melhor interesse, sua estabilidade emocional e seu desenvolvimento integral.
A Lei nº 13.845/2019 incluiu o art. 53-A na LDB e garante que irmãos tenham direito de estudar na mesma instituição de educação básica, salvo impossibilidade real de vaga ou de turno, o que não se aplica ao caso: aqui, estamos falando da mesma etapa da Educação Infantil e da própria unidade em que os irmãos já estão matriculados. Além disso, muitas crianças desta comunidade já estão adaptadas ao espaço físico, às rotinas e às equipes do CMEI, inclusive crianças neurodivergentes (autistas, TDAH), para as quais mudanças bruscas e sucessivas de ambiente podem gerar crise emocional e prejuízo pedagógico.
A retirada do Infantil 5 obrigaria crianças menores de seis anos a enfrentar duas mudanças de escola em dois anos consecutivos, e isso sem prévia discussão com as famílias, que só foram informadas da mudança no ato da matrícula, isto é, tardiamente. Isso impediu que as famílias pudessem, com calma e antecedência razoável, avaliar outras possibilidades, dialogar com a gestão municipal, ou mesmo planejar rotinas de transporte.
A comunicação feita apenas no momento da matrícula retira dos pais o direito material de participar da construção da solução e transforma um tema pedagógico em mera “imposição administrativa”. Além disso, pais e mães relataram preocupação objetiva com a infraestrutura do novo local indicado para receber as crianças do Infantil 5.
Há dúvidas não esclarecidas sobre as condições físicas desse espaço, inclusive aspectos básicos de proteção contra sol e chuva em áreas externas de uso comum, condições mínimas que são essenciais para garantir um ambiente seguro, acessível e regulado sensorialmente, sobretudo quando se trata de crianças neurodivergentes.
Tal cenário contraria o dever do Município de oferecer educação infantil adequada, acessível e contínua em creche e pré-escola até os cinco anos de idade.
- Da adaptação das crianças neurodivergentes e da necessidade de estabilidade ambiental
Há crianças matriculadas no CMEI Celeste Sottomaior que são neurodivergentes, em uma dessas família, o filho é autista (nível de suporte 2) e com TDAH. Essas crianças têm direito, amparado pela legislação brasileira de inclusão (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Lei nº 13.146/2015), a condições de acessibilidade, atendimento adequado, previsibilidade de rotina e adaptações razoáveis no ambiente escolar. Em outras palavras, isso não é um favor. É um direito.
Segundo relato dessa família, uma das estratégias mais utilizadas pelas professoras, em momentos de desregulação sensorial ou emocional, é levar a criança para um espaço externo, mais calmo, até que ela retome o equilíbrio. Hoje, esse espaço existe no CMEI e faz parte da rotina construída com a equipe. No entanto, não houve esclarecimento da Secretaria sobre se o espaço alternativo proposto para o Infantil 5 terá sequer cobertura mínima nessa área externa. A permanência fora da sala de aula, para regulação emocional, não é viável em local descoberto, sob sol forte ou chuva.
Essa ausência de garantia estrutural mínima não é detalhe técnico: para uma criança autista, uma mudança brusca de ambiente físico pode desencadear crise, angústia, recusa de entrada na sala e sofrimento psíquico. Isso se agrava quando, além da troca de rotina, há um ambiente desconhecido e possivelmente menos protegido.
Outro relato de família reforça esse ponto: mesmo permanecendo no mesmo CMEI, com os mesmos colegas há três anos, uma criança autista ainda enfrenta dias em que não quer entrar em sala. Essa resistência acontece mesmo em um espaço que já é familiar, previsível e afetivamente seguro. Forçar essa mesma criança a passar por duas mudanças seguidas de ambiente (sair agora e, no ano seguinte, sair de novo) significa impor a ela uma sequência de rupturas que podem gerar insegurança, medo, transtorno emocional e recusa escolar.
Esse tipo de impacto não é “opinião dos pais”; ele é reconhecido por toda a literatura educacional e pela legislação de inclusão como fator que precisa ser prevenido por meio de planejamento e adaptação razoável. A Lei Brasileira de Inclusão determina que a oferta educacional deve garantir “acessibilidade, recursos de apoio e adaptações razoáveis” para assegurar o aprendizado e a participação plena de estudantes com deficiência, incluindo o transtorno do espectro autista.
Transferir compulsoriamente essas crianças para um espaço novo, sem planejamento adequado e sem prova de que a estrutura física atende minimamente a suas necessidades sensoriais e de regulação, afronta diretamente esse direito.
- Da prioridade da família e da convivência entre irmãos
A Constituição Federal determina que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar, com absoluta prioridade, os direitos da criança, garantindo seu desenvolvimento físico, emocional e social. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reafirma essa prioridade absoluta e o princípio do melhor interesse da criança. Essa prioridade não é abstrata.
Manter irmãos na mesma unidade escolar é, ao mesmo tempo: proteção emocional (segurança afetiva, especialmente na primeira infância); organização da rotina familiar (entrada, saída, acompanhamento) e garantia de cuidado ampliado, pois irmãos pequenos constituem, entre si, rede de suporte e referência. A Lei nº 13.845/2019 incluiu na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) o art. 53-A, que assegura o direito de matrícula de irmãos na mesma instituição de educação básica.
No caso concreto: estamos falando da mesma etapa da Educação Básica, a Educação Infantil, que compreende creche e pré-escola para crianças até 5 anos; ambas as crianças pertencem à rede municipal e já estão vinculadas ao CMEI Celeste Sottomaior; não há mudança de modalidade de ensino, apenas supressão administrativa da turma pretendida.
Portanto, a não abertura de turmas de Infantil 5 no CMEI inviabiliza, na prática, o exercício desse direito previsto em lei federal, obrigando a separação de irmãos e produzindo ruptura familiar que não decorre de impossibilidade real, mas de uma decisão de organização interna da Secretaria.
Manter irmãos na mesma unidade promove:
(a) continuidade de vínculos pedagógicos e socioafetivos;
(b) organização familiar e segurança das crianças;
(c) integração comunitária do CMEI, que é um espaço conhecido e de confiança;
(d) respeito as leis.
Rompê-los artificialmente contraria esse conjunto de garantias.
- Da necessidade de estabilidade e continuidade pedagógica na primeira infância
Crianças menores de 6 anos estão em processo de construção de segurança emocional básica, de vínculo com adultos de referência, de socialização entre pares e de reconhecimento espacial (“este é o meu lugar”). Interromper isso repetidamente gera impacto real.
A proposta apresentada atualmente pela Secretaria implica, para muitas famílias, duas mudanças sucessivas em dois anos seguidos: agora, saída forçada do CMEI Celeste Sottomaior; no ano seguinte, nova troca de espaço, pois a etapa seguinte tampouco permaneceria estável.
Submeter uma criança de 4, 5 anos a duas quebras de ambiente em sequência não é pedagogicamente justificável. Isso vale especialmente para crianças neurodivergentes, mas não só. A previsibilidade cotidiana, chegar no mesmo portão, ver as mesmas paredes, encontrar os mesmos adultos, faz parte do próprio processo de alfabetização emocional da criança nessa faixa etária.
A legislação educacional reconhece que a Educação Infantil deve assegurar o “desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, em complementação à ação da família”. Não é possível dissociar “psicológico e social” de estabilidade de ambiente. Estabilidade é parte da política pública, não capricho familiar.
- Do dever do Município em garantir oferta adequada e planejamento transparente
A Constituição Federal determina ser dever do Estado garantir educação infantil em creche e pré-escola às crianças até 5 anos. A LDB atribui expressamente ao Município a incumbência de oferecer Educação Infantil em creches e pré-escolas.
Desde 2013, a matrícula na pré-escola (4 e 5 anos) tornou-se obrigatória, e os pais têm a obrigação de matricular suas crianças a partir dos 4 anos de idade. Isso significa que a Prefeitura tem o dever correlato de garantir vaga para todas as crianças dessa idade.
Da mesma forma, o princípio da boa-fé administrativa e o próprio direito constitucional garantem às famílias, o direito de serem informadas com antecedência, de forma clara e fundamentada, sobre mudanças que afetem diretamente a trajetória escolar de seus filhos, e o direito de participar do processo, propondo alternativas.
Ter sido avisados apenas no ato da matrícula elimina a possibilidade de diálogo prévio, de construção conjunta de solução e de planejamento familiar mínimo. Esse tipo de procedimento fere o interesse superior da criança e coloca toda a pressão logística, emocional e financeira exclusivamente sobre as famílias.
- Da viabilidade administrativa
Sabemos que a criação de uma ou mais turmas de Infantil 5 no CMEI Celeste Sottomaior demanda organização interna da rede. No entanto, também sabemos que isso é possível, na prática de qualquer rede municipal, por meio de:
(a) rearranjos de lotação;
(b) ampliação do espaço físico;
(c) otimização de espaços já existentes;
(d) remanejamento responsável de profissionais;
(e) e, se necessário, ampliação pontual do quadro docente e de apoio.
Essas medidas são usuais quando há demanda comprovada de famílias e quando a manutenção da oferta atende um direito legalmente protegido — como é o caso da convivência entre irmãos e da adaptação razoável de crianças neurodivergentes.
- Do pedido
Diante de todo o exposto, REQUEREMOS:
- A manutenção das turmas de Infantil 5 no CMEI Celeste Sottomaior, garantindo:
(a) a permanência de irmãos na mesma instituição de ensino, nos termos do art. 53-A da LDB, incluído pela Lei nº 13.845/2019;
(b) a continuidade pedagógica e emocional das crianças pequenas, evitando duas mudanças sucessivas de ambiente em período inferior a dois anos;
(c) o respeito ao direito das crianças neurodivergentes a um ambiente previsível, acessível, conhecido e com adaptações razoáveis (Lei Brasileira de Inclusão – Lei nº 13.146/2015);
(d) a manutenção do vínculo comunitário e territorial assegurado pelo ECA e pela Constituição Federal.
- Que a Secretaria informe, de forma oficial e transparente, os critérios administrativos que embasaram a decisão de suprimir as turmas de Infantil 5 no CMEI Celeste Sottomaior, bem como apresente estudo de impacto dessa medida sobre:
(a) rotina familiar;
(b) inclusão de crianças neurodivergentes;
(c) direito de irmãos estudarem juntos;
(d) respeito aos aspectos pedagógicos e emocionais nas crianças.
Que seja reconhecido o direito das famílias de participar desse processo decisório ANTES que ele seja imposto, garantindo diálogo institucional, e não mera comunicação tardia.
Em última instância que a Secretaria Municipal de Educação apresente, por escrito, a avaliação técnica sobre as condições físicas e de acessibilidade do espaço alternativo proposto para receber as crianças do Infantil 5 (incluindo áreas externas cobertas, possibilidades reais de acolhimento sensorial e garantia de segurança climática em dias de sol e chuva), especialmente para crianças com TEA e TDAH.
Por fim, solicitamos resposta formal e fundamentada, em prazo razoável, a este requerimento, nos termos do direito constitucional de petição aos órgãos públicos e que este seja feito em atenção aos problemas e situações aqui pontuadas e não a partir de respostas frias, burocráticas e desconectas da realidade desta comunidade.
Foz do Iguaçu, 28 de outubro de 2025.
Assinam esta carta, Pais, Mães e responsáveis legais.


