Lixo hospitalar: matéria-prima barata que coloca em risco a saúde coletiva

Material suspeito chamou a atenção de agentes da Receita Federal, em Porto de Suape, em Ipojuca, no Grande Recife. No contêiner, estavam 14,8 toneladas de lixo hospitalar

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Por AIDA FRANCO LIMA | OPINIÃO

Mais uma vez, o Brasil está sendo usado para receber lixo hospitalar. Não é a primeira e certamente não será a última. E a informação na mídia sobre os (ir)responsáveis é bastante sigilosa. O nome de quem importou, até o momento, está preservado. Mas quem é esse sujeito oculto que comete um crime e tem seu nome protegido? É que se o criminoso não respeita a lei, ainda assim ele tem o direito ao sigilo fiscal.

A notícia circulou nesta semana depois que a Alfândega da Receita Federal identificou, no Porto de Suape, no Grande Recife, um contêiner, originário de Portugal, com cerca de 15 toneladas de material hospitalar usado para administrar medicamentos por meio das veias: mangueiras, bolsas de sangue e outros objetos. 

Importar resíduo hospitalar é proibido. Contudo, na nota de importação, constava tratar-se de polímeros de cloreto de vinila. Esse material é base para a fabricação do policloreto de vinila (PVC). O PVC faz parte do nosso cotidiano, desde as tubulações às embalagens diversas. Ou seja, alguém iria vender gato por lebre.

Quando li essa notícia, lembrei-me de um caso similar, ocorrido também na mesma região, no ano de 2011. Basta dar um Google para rever as notícias da época. Uma empresa, sediada em Santa Cruz do Capibaribe, comprou lençóis descartados por hospitais dos Estados Unidos – leia-se lixo hospitalar. Revendido, o material era usado como forro de roupas e para cobrir camas de hotéis e motéis.

Informações dão conta de que naquele período foi apreendida quantidade suficiente para confeccionar bolsos para sete milhões de jeans. Mas pelo visto o uso de material hospitalar por alguns empresários do universo das confecções não se restringe apenas a material importado. Há registros de forros com marcas de hospitais do Distrito Federal e Belo Horizonte.

Sobre essa apreensão recente, li muitos comentários na internet de pessoas dizendo que Portugal usa o Brasil como uma colônia para depositar seu lixo. Acontece que se esses materiais são importados, significa que tem muita gente lucrando no Brasil tendo como moeda de troca a saúde pública.

Mais uma vez, não só nesse setor, como em muitas outras áreas, o empresariado que acha uma brecha ou usa o “jeitinho brasileiro” fica com o bônus do lucro fácil; e a coletividade, com o ônus.

Todos somos expostos à contaminação quando material hospitalar que deveria ser tratado com métodos controlados entra para circular no cotidiano sem qualquer cuidado. De repente, a pessoa vai pegar a carteira no bolso e sai com uma bactéria multirresistente, porque ali está parte de um produto contaminado.

A ganância, a sede por lucro fácil, o prazer em desafiar as leis, tudo isso nos leva a um caminho perigoso. E toda a cadeia produtiva vira refém dessa situação, pois todos somos consumidores diretos e indiretos dessas mercadorias cuja matéria-prima é duvidosa.

Não é possível esperar a conscientização de quem sabe que está cometendo um crime e colocando a saúde pública em risco. Entre os caminhos para estagnar essa sangria desatada em torno do lucro a qualquer preço há algumas diretrizes importantes. Além de assegurar o trabalho essencial da fiscalização e a imposição de penas duras para quem comete tais crimes, é fundamental abrir canais que estimulem as denúncias. Se o governo proporcionar meios para que os denunciantes tenham sigilo garantido e, ainda por cima, recebam alguma recompensa, muita gente ficará em maus lençóis.

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