Reinventando Foz não saiu do papel, fracasso da prefeitura na preservação de rios

Promessa era revitalizar rios Boicy e Monjolo e Ouro Verde, gerar 7.500 empregos e realocar 500 famílias para moradias populares; programa está zerado de orçamento.

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Em julho de 2018, um ano após assumir, o prefeito Chico Brasileiro (PSD) trouxe a público um projeto que reunia várias dimensões de políticas públicas, o qual pretendia transformar em vitrine da gestão que começava. Sob etiquetas de sustentabilidade, agenda social, turismo e geração de empregos, era anunciado o programa Reinventando Foz.

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A grandiosidade da ação retirou o prefeito do gabinete no Palácio das Cataratas para amassar barro, literalmente, nos agonizantes corpos d’água do Parque Monjolo, na região do Jardim Central. Houve entrevista coletiva ao ar livre com parceiros, como os diretores da Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), a financiadora da conta.

O programa desmoronou como a argila que contrai as margens de rios de Foz do Iguaçu assoreados, poluídos ou agredidos até mesmo pela imperícia da própria administração, caso da máquina que atolou há pouco no lago do Monjolo. A ação ambiental, social e econômica fracassou, não saiu do papel.

Chico Brasileiro, auxiliares e diretores da Agência Francesa de Desenvolvimento no lançamento do programa, no Parque Monjolo – foto: Arquivo AMN

As cifras eram altas, R$ 142 milhões financiados em cinco anos, dos quais R$ 28 milhões caberiam à contrapartida municipal. O projeto previa a restauração completa dos três afluentes do Rio Paraná, que são os rios Boicy e Monjolo e o Arroio Ouro Verde.

No melhor dos mundos – licença ao francês Voltaire – para a natureza e a qualidade de vida dos iguaçuenses, estavam programadas a criação de corredores de biodiversidade e a renaturalização da mata ciliar; além da construção de ciclovias, pistas de caminhada, parques e jardins. Isso em todos os afluxos.

Era início de mandato, o que recomendava ao administrador nível alto de sinergia com os legisladores. Chico Brasileiro, mais uma vez, desceu a escadaria do predinho antigo na Praça Getúlio Vargas. Foi à Câmara de Vereadores, em novembro de 2018, para apresentar o Reinventando Foz, designado como “macroprojeto de reestruturação urbana” pela Casa de Leis.

“Percebemos que precisávamos ter um conjunto de intervenções para que o cidadão e o turista possam reinventar os espaços urbanos”, disse na época. “O conceito da água dos rios de nossa cidade também não é bom, e vimos que isso é necessário de ser mudado, até porque organismos internacionais avaliam a cidade pela qualidade das águas”, completou.

Rio Boicy, abaixo da nascente, em ocupação na região do Portal da Foz. Registro da última sexta-feira, 10.

O programa fazia jorrar números. O Reinventando Foz estava vocacionado a gerar 7.500 empregos diretos e indiretos e a aumentar o tempo de permanência do turista em Foz do Iguaçu. Com efeito, mais cômputos, o Produto Interno Bruto (PIB) do setor turístico saltaria de 25% para 35%, previa a governança.

E cerca de 520 famílias que viviam às margens das três artérias do Paranazão seriam realocadas para áreas adequadas, com a construção de moradia popular. A promessa era dar dignidade às pessoas, em áreas dotadas de saneamento e melhor infraestrutura urbana.

Sim dos vereadores

Vereadores da legislatura passada (2017–2020), que testemunharam a explanação de Chico Brasileiro, receberam logo depois a matéria para deliberar. O Projeto de Lei n.º 128 autorizava o Poder Executivo a contratar empréstimo com a agência francesa, aprovado sem delongas.

Votos contados, foi dito, via portal institucional da Câmara, que se tratava de “investimentos na cidade para o crescimento e desenvolvimento de Foz do Iguaçu, tanto para seus moradores, quanto para o turismo do município”. Não sem antes a bancada de apoio ao governo realçar a importância da proposta.

Diante de poucas indagações sobre a condição de endividamento da prefeitura naquele período, a vereança aliada de Chico Brasileiro se revezou para passar tranquilidade ao contribuinte. Foram à tribuna Beni Rodrigues, Elizeu Liberato, Jeferson Brayner, João Miranda, Marcelinho Moura, Nanci Rafagnin Andreola e Rosane Bonho. Coincidências do rio da vida que corre: nenhum deles contou com a reeleição.

Afogado no seco

Ano de 2020. Moradores e turistas seguiam sem o impacto positivo do Reinventando Foz. Em abril, Chico Brasileiro remanejou R$ 627 mil que eram destinados ao programa, sendo assim desidratado após ser anunciado como a magnânima ação local para a conservação dos rios e a modificação socioeconômica de áreas da cidade.

Depois, em setembro, só restavam menos de quatro meses para o fim do primeiro mandato de Chico Brasileiro. Nada de resultados. Foi quando o prefeito autorizou a contratação de uma assessoria técnica para o programa, em edital que liberava valor de até R$ 3,7 milhões.

Na época, o H2FOZ registrou os atos. “O edital foi publicado em 24 de julho, embora o projeto básico de licitação tenha sido assinado em 11 de novembro de 2019. Quem assinou o termo de referência da disputa foi o então secretário municipal de Planejamento e Captação de Recursos Elsídio Emílio Cavalcante (que saiu da pasta em abril)”, noticiou o portal.

O objetivo era contratar empresa para levantamentos e estudos, elaboração de documentos técnicos e projetos de arquitetura e de engenharia para execução das obras, tal qual a contratação de mão de obra especializada para o programa. Conforme a prefeitura, a contratação não aconteceu.

Reinventando Foz previa mobiliário urbano para a população desfrutar da áreas naturais – foto: Reprodução/Prefeitura

A promessa do Reinventando Foz foi, ainda, renovada, mas não cumprida. Em sabatina entre os candidatos a prefeito na eleição de 2020, promovida pelo Observatório Educador Ambiental Moema Viezzer, o então candidato à reeleição Chico Brasileiro disse em vídeo que levaria a cabo o programa, como ação para cuidar de rios e nascentes.

Outro lado

No mês passado, em 18 de março, a reportagem remeteu perguntas sobre o Reinventando Foz para a Diretoria de Comunicação da prefeitura. Somente em 2 de abril a administração respondeu quanto à contratação de consultoria. No dia 4, abordou recursos movimentados. Até o momento, a demanda não foi atendida integralmente.

Eis as respostas da prefeitura:

  • a administração diz não ter executado recursos para o programa;
  • a licitação para contratar a empresa de consultoria foi considerada deserta, não houve contratação nem pagamentos para essa finalidade;
  • valor não foi realocado posteriormente ao Reinventando Foz, porque o programa “estava suspenso naquele exercício”;
  • para 2024, não há valores para a ação, pois o “projeto não foi previsto” na Lei de Diretrizes Orçamentárias nem na Lei Orçamentária Anual, pontuou a prefeitura.

Quanto aos R$ 627 mil, a assessoria da gestão municipal deu a seguinte resposta:

“Naquele momento, com a parceria com a Agência Francesa suspensa, os recursos foram destinados à Secretaria Municipal de Tecnologia da Informação (encaminhou o Decreto 28.049 na forma de anexo), com o objetivo de aquisição de licenças para uso do antivírus Trend Micro Enterprise, para utilização durante 36 (trinta e seis) meses.”

A administração não respondeu à reportagem quais foram as ações desenvolvidas pelo programa desde 2018 até o momento, nem qual é o status atual do Reinventando Foz. Também não obteve resposta sobre qual é a situação, agora, da parceria entre a prefeitura e a Agência Francesa de Desenvolvimento.

Assista ao vídeo de apresentação do projeto.

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1 comentário
  1. Adelar Guilherme Matté Diz

    Pois é…
    Gastaram todos os R$ 627 mil no Anti Vírus ????
    Lembro que conversando com um prefeito de Foz anterior e ele falando em implantar kms de Ciclovias, sugeri a ele que implantasse Parques Ambientais Lineares (seguindo o curso dos rios urbanos) com as tais Ciclovias que ofereceriam um “plus” pois não teriam “subidas” e nem “descidas” e poucos cruzamentos….

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