A perfumaria de março

Datas comemorativas são usadas como marketing de algo que na prática não existe.

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Aida Franco de Lima – ARTIGO

Na música de Elis Regina diz que as águas de março fecham o verão e que é promessa de vida no teu coração. As datas festivas lembram de ‘coisas’ importantes como o Dia Mundial das Florestas, seguido do Dia Mundial da Água, 22. Sendo que o mês teve início com o Dia Internacional das Mulher, 08. O mês está recheado de datas significativas, que na prática não recebem a mínima importância.

Não faltam datas para lembrar de temas essenciais, porém o que normalmente acontece que é na maioria das vezes tais dias só estão presentes nos calendários e pouca coisa muda na vida real. Se não conseguimos preservar as árvores urbanas, a quem cabe a tarefa de salvar as florestas que ainda restam? Se praias conhecidíssimas não são indicadas para banhos, por causa da poluição, o que dirá de áreas não badaladas? E a violência de todos os modos cometidos contra as mulheres, que a cada momento toma conta dos noticiários?

São poucas as pessoas que tomam para si a responsabilidade de ajudar a resolver os problemas do Planeta. Na maior parte das vezes as pessoas estão envolvidas com seus afazeres diários e não sobra tempo para olhar para o entorno, pensar em sua responsabilidade com os problemas da cidade. É como se o meio ambiente não fizesse parte do todo. Observem onde moram. Onde era pasto, onde era zona rural, sem muito estardalhaço, as câmaras dos vereadores aprovam a mudança do zoneamento. E então, do nada, aquilo que tinha floresta e minas de águas vai sendo tomado pelas máquinas e construções.

E não estou falando do passado distante, de quando os pioneiros desmatavam para dar lugar às cidades. Estou me referindo ao passado bem recente, em que mesmo havendo inúmeras áreas desabitadas nos centros urbanos, o crescimento das cidades avança em direção ao que resta de verde.

A população que não conseguiu se estabelecer nas áreas mais nobres das cidades sente-se obrigada a migrar para as periferias, nos novos conjuntos habitacionais, no meio do nada, longe da infraestrutura que pagamos com nossos impostos, como escolas e postos de saúde. Mas de outro modo, há também uma elite que banca desmatamentos para que possam morar em suas bolhas, dentro de condomínios fechados, em meio à natureza que ela abocanhou.

Como disse anteriormente, boa parte das secretarias de meio ambiente não passam de carimbadoras que dão aval para obras e empreendimentos que colocam em risco a sustentabilidade ecológica. E são essas mesmas secretarias que fazem ações de conscientização em datas comemorativas, que se aproveitam do marketing verde para simular o que não é feito na prática. Queria morar na cidade imaginária delas, onde tudo é perfeitinho.

Do mesmo modo temos o grave problema com a água potável ou qualquer uma delas. Na semana passada vi um vídeo de um influencer brasileiro que foi à África fazer trabalho comunitário. Na verdade não sei se foi pra trabalhar, pra gravar ou praticar o inglês, ou o combo. E uma das coisas que ele viu lá e o chocou é que nos banheiros não usa-se água. É um método arcaico, mas que funciona sem o desperdício deste líquido tão precioso e raro, principalmente naquele continente.

Então a primeira coisa que o rapaz fez, tentando ajudar a escola, foi cotar valores para construir ao menos dois banheiros, no modelo que a média do brasileiro conhece. Mas os diretores da escola não deixaram, por vários motivos. Entre eles, por conta do desperdício de água e porque as crianças começariam a comparar com o que tinha em suas casas.

Quando vi o vídeo me lembrei exatamente das fossas ecológicas, das fossas de bananeiras, entre outros nomes similares. Que é um conceito em que tudo se reaproveita e os resíduos não agridem o meio ambiente. Mas quem é que está preocupado em economizar, se basta pagar para ter água e luz? O problema não parecer ser a escassez de recursos, mas sim a falta de dinheiro.

O rapaz que foi para a África e sente na pele o que é a falta de água, não tem culpa de tentar soluções que o dinheiro oferece. Esse é o pensamento da grande maioria das pessoas. Estamos saindo do verão escaldante, as pessoas ainda reclamam muito do calor e clamam pelo outono. E quem pode comprar ar-condicionado, parece ter resolvido o problema. Não se pensa nas origens dos fatos. Mas na solução mais rápida, que normalmente parece requerer apenas dinheiro.

Quando chegarmos no inverno a choradeira será enorme também. Infelizmente veremos as mesmas cenas de sempre, pois nossas casas não são calafetadas e não estamos todos preparados para as baixas temperaturas. Se sofrem quem tem uma residência em que o frio entra pelas frestas, imagine quem está nas ruas sem teto algum? É uma espécie de jogo de empurra-empurra, em que não buscamos a solução dos problemas e a natureza acaba sendo a grande vilã.

Vivemos na era em que os seres humanos mais têm acesso à informação. A conexão em massa deveria nos apontar para caminhos mais inteligentes, para cuidarmos das florestas, das águas e respeitarmos as mulheres. Mas até o momento, isso não se concretizou. A música de Elis conta com várias estrofes, e precisamos mudar o rumo, para que não reste apenas um único refrão : “É pau, é pedra, é o fim do caminho…”

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