
Foz do Iguaçu é uma cidade onde ainda parece que tudo está por fazer, em quase todas as áreas. Às vezes é falta de recursos. Às vezes é falta de planejamento. E às vezes é puro descaso (ou coisa pior).
É o caso dos chamados vazios urbanos, que engessam o desenvolvimento da cidade e fazem com que ela se espalhe cada vez para mais longe, obrigando o poder público a levar, de forma sempre mais onerosa, os serviços essenciais.
A Prefeitura sabe que esses terrenos desocupados estão nas mãos de meia dúzia de especuladores. Tanto que o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado Sustentável, de 2016, que vigora até 2026, tem até uma expressão bonita para os terrenos baldios: "reservas especulativas".
O plano aponta que, apenas num raio de cinco quilômetros da área central, quase um terço das propriedades são terrenos vazios, privados e municipais.
A área em questão é o quadrilátero formado pelas Avenidas JK, Jorge Schimmelpfeng, República Argentina e Paraná.
Nessa área central, estão "terrenos vazios que receberam infraestrutura do município, sem interesse de ocupação pelos proprietários, mantidos apenas com o propósito de valorização venal", diz o Plano Diretor.

Construções abandonadas
Há outro problema, tão ou mais visível do que os terrenos baldios: as construções abandonadas, seja lá por qual motivo. E aí entram propriedades particulares e de estatais como a Caixa Econômica Federal e os Correios, que largaram edificações à própria sorte.
Por que isso acontece em Foz do Iguaçu? Não há uma lei que coíba a especulação, que faça com que o dono de um terreno baldio ou de um prédio abandonado seja obrigado a fazer alguma coisa?



Pior que existe. É lei municipal e está embasada no Estatuto da Cidade, de 2001, que "estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental".
No caso de Foz, a Lei Complementar 249/2015 "institui os instrumentos para o cumprimento da Função Social da propriedade urbana no município de Foz do Iguaçu, que são: parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, IPTU progressivo no tempo e desapropriação com pagamentos em títulos".
Na lei e no Plano Diretor
Está na lei, está no Plano Diretor do município. Em nome da "função social da propriedade urbana", a Prefeitura poderia utilizar instrumentos como o IPTU progressivo no tempo e até desapropriar com pagamento ao proprietário em títulos municipais.
E por que não se faz isso? Porque a lei (que veio tarde, é de 2015) ainda não foi regulamentada, cinco anos depois de publicada.
Puro descaso (ou coisa pior), porque quem se beneficia disso são os donos dos vazios urbanos e também aquilo que chamam de "máfia dos condomínios e loteamentos".
O que é o IPTU progressivo

O Estatuto da Cidade permite ao município criar uma lei específica para área incluída no Plano Diretor, para exigir o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado.
Um dos meios para obrigar o proprietário de um terreno baldio a utilizá-lo ou vendê-lo é o IPTU progressivo no tempo, com o aumento da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.
Hoje, o iguaçuense que tem uma casa ou apartamento paga de IPTU 1% do valor venal do imóvel; o proprietário de um terreno paga 2%.
No caso do IPTU progressivo, o proprietário de um terreno baldio em área nobre recebe um prazo da Prefeitura para construir ou vender. Em caso de não cumprimento, a Prefeitura aplicaria a alíquota de 4% no ano seguinte; e iria aumentar progressivamente até o máximo de 15%.
Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida em cinco anos, o município manteria a cobrança pela alíquota máxima até que o proprietário atendesse a determinação.
Há mais: depois de cinco anos de cobrança do IPTU progressivo a Prefeitura poderia proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública.
O que falta pra vigorar
Em entrevista à Rádio Cultura, em agosto do ano passado, o secretário da Fazenda, Ney Patrício, foi perguntado sobre os vazios urbanos e disse que o prefeito Chico Brasileiro iria utilizar o IPTU progressivo.
Mas, até o final de 2019, a lei não foi regulamentada. E, em ano de eleição, que prefeito poria a mão nesta cumbuca?
Enquanto isso, o especulador ganha mais um loooongo prazo para ver seu terreno valorizar-se cada vez mais, enquanto a população procura, lá no fim da periferia, um cantinho pra morar. E a Prefeitura tem que providenciar as mínimas condições pra que seja atendida com transporte, arruamento, luz, água, etc, etc.
Abandono

Quanto aos edifícios abandonados, inacabados, que também se espalham por toda a cidade, os casos são diversos. Há os particulares, como um antigo hotel perto da rodoviária; há os públicos, como o prédio inacabado do Tribunal de Justiça; e há ainda os de estatais, como os da Caixa e Correios.
Este caso do prédio da Caixa, na Avenida JK, é até engraçado, como contou Ney Patrício na entrevista à Rádio Cultura. A única coisa que a Prefeitura pode fazer, segundo ele, é exigir que sejam colocados tapumes, por exemplo, para impedir que vândalos destruam tudo, como aconteceu, por sinal.

Mas a Caixa queria vender e fez várias tentativas. Na primeira delas, fez um leilão em que pediu mais de R$ 9 milhões. Nenhuma proposta. Baixou pela metade. Nada. No último leilão, o valor mínimo era de R$ 3,8 milhões. Nada. O prédio continua lá, cada vez mais deteriorado.
Talvez seja um alerta aos especuladores? Esperam, esperam pra pedir o máximo, e de repente o que têm vale bem menos do que sonham? Talvez não, porque especuladores são muito vivos.
Já os Correios, depois que o prédio sofreu vandalismo e por pressão da Prefeitura, colocou tapumes. Mas continua abandonado.
Há outros casos, segundo Ney Patrício, em que a Prefeitura fica de mãos amarradas porque são situações de litígio, entre herdeiros do proprietário ou até entre o agente financiador e a construtora, que não pagou o empréstimo e perdeu o imóvel. E o financiador deixou por isso mesmo, abandonado, enquanto tenta resolver a pendenga na Justiça.

E assim caminha Foz.
Fontes: Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado Sustentável e Portal Tributário
Comentários estão fechados.