As queimadas que atingem o Brasil não são as únicas ameaças ao meio ambiente. Foz do Iguaçu também passa por uma escalada de incêndios em áreas de vegetação. Somente neste ano, 160 ocorrências foram registradas nas áreas urbanas e rural da cidade, conforme estatísticas do 9.º Grupamento de Bombeiros.
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O número representa um aumento de 108% em relação ao mesmo período do ano passado, quando foram contabilizados 77 incêndios. Em todo o ano de 2023, o total de ocorrências foi de 103.
A situação também é crítica em todo o estado do Paraná, onde foram registrados 48.051 combates a incêndios florestais nos últimos cinco anos, ou seja, de 2019 até 2023. Somente neste ano, até 11 de setembro, já são 11.115 ocorrências dessa natureza, contra cerca de dez mil nos 12 meses de 2023.
“Percebe-se uma acelerada e crescente tendência, que pode ser justificada por fatores climáticos, aquecimento global, entre outras ações humanas”, diz o major Marco Antonio Ferreira Pereira, presidente da Câmara Técnica de Combate a Incêndios Florestais do Corpo de Bombeiros Militar do Paraná.
O major explica que é crime colocar fogo em áreas de vegetação. O procedimento só é permitido em algumas circunstâncias e mediante autorização de órgão ambiental, em casos de manejo.
Ele informa que para determinar as causas dos incêndios na cidade é preciso perícia, porém a tendência é de que a maioria dos atos seja intencional. “A pessoa coloca fogo, gera um desmatamento expressivo, perde o controle do fogo e queima muito mais do que era para queimar”, frisa. Dificilmente se identificam os culpados pelos incêndios. Quando isso ocorre, é mediante denúncia.
O período mais crítico para incêndios é entre os meses de julho e outubro, quando ocorrem estiagens, geadas, solo e vegetação mais secos, menor incidência de chuvas, propiciando de forma mais facilitada o início e descontrole de um foco de incêndio florestal.
Atear fogo na vegetação, além de ser um ato criminoso, provoca o desmatamento da flora, da fauna, e destruição do patrimônio, edificações, cultivos, rebanhos e até a vida humana.
O problema extrapola o meio ambiente. A saúde, não só de animais, também fica bem prejudicada. Médico pneumologista do Hospital Costa Cavalcanti, Luiz Henrique Zaions reforça que há pessoas que infelizmente estão fazendo queimada de objetos e de galhos próximo à residência delas ou em terrenos baldio, soltando fumaça, fato que piora as condições de saúde da população. “Esse fato somado à fumaça que já tem na atmosfera vai piorar bastante a saúde de qualquer pessoa, principalmente quem tem doenças preexistentes”, adverte.
Os bombeiros recomendam:
- não soltar balões;
- não utilizar fogo para limpar terrenos;
- não jogar bitucas ou embalagens pela janela do carro;
- destinar todos os resíduos (orgânicos e recicláveis) corretamente.
Multas
“Art. 58-A. Provocar incêndio em floresta ou qualquer forma de vegetação nativa:
Multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por hectare ou fração.”
“Art. 58-B. Provocar incêndio em floresta cultivada:
Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por hectare ou fração.”
“Art. 58-C. Deixar de implementar, o responsável pelo imóvel rural, as ações de prevenção e de combate aos incêndios florestais em sua propriedade de acordo com as normas estabelecidas pelo Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo e pelos órgãos competentes do Sisnama:
Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$10.000.000,00 (dez milhões de reais).”
ENTREVISTA: Fernando Sivelli, engenheiro agrônomo, analista ambiental do ICMBio e chefe-substituto do Parque Nacional do Iguaçu
Em Foz do Iguaçu, o número de incêndios florestais dobrou neste ano em relação ao mesmo período do ano passado. O clima seco facilita isso ou é irresponsabilidade?
É amplamente divulgado que a maior parte dos incêndios florestais no Brasil são por alastramento de focos causados diretamente por ação humana, seja pela queda de balões ou pelo uso irregular do fogo em atividades agropecuárias, na queima de lixo, para limpeza de terrenos, bem como ações deliberadamente criminosas de incendiar propriedades rurais alheias, queima direta de florestas e áreas naturais.
Em Foz do Iguaçu, todos os anos, ocorrem ações irregulares da utilização do fogo, porém nesta temporada os registros de incêndios foram intensificados por questões climáticas e acúmulo de biomassa, material vegetal seco. A combinação de dias com baixa umidade, altas temperaturas e ventos favorece a ocorrência e propagação de incêndios. Temos a percepção que, em relação ao ano passado, ocorreram mais dias favoráveis ao fogo.
Os efeitos das mudanças climáticas já são perceptíveis em Foz do Iguaçu?
Globalmente, estamos verificando o início de uma nova fase de extremos climáticos. Nossa região começa a sentir os efeitos dessas mudanças, e é esperado que se intensifiquem cada vez mais nas próximas décadas. Neste contexto, os incêndios florestais são uma face de um problema maior. É fundamental que o município de Foz do Iguaçu esteja preparado para a adaptação climática.
Foz tem muitas potencialidades para esse desafio, como, por exemplo, grandes empresas, centros de pesquisa, universidades, órgãos públicos diversos, um parque nacional mundialmente conhecido, a maior hidrelétrica do mundo em geração de energia, diversas etnias e culturas vivendo em harmonia e uma população que começa a se organizar. Temos os meios para aprofundar o processo de adaptação climática, mas ainda não é amplamente reconhecido e debatido no âmbito político local.
Quanto às queimadas, os efeitos da fumaça que chega a Foz do Iguaçu prejudicam a fauna e flora local?
Para os moradores da região, os impactos das queimadas na Amazônia e no Pantanal eram acompanhados apenas pelas mídias, que mostravam cidades de outros estados imersas em nuvens de fumaça e grandes áreas naturais totalmente devastadas, com estimativas de quantidades inimagináveis de animais silvestres afugentados, feridos e mortos. Nos últimos anos, passamos a olhar para céu de Foz, durante alguns dias nos períodos de queimada no país, e ver acinzentado o que deveria ser azul, e conseguir olhar diretamente ao sol avermelhado e ofuscado pela fumaça na alta atmosfera.
Recentemente, na primeira quinzena de setembro, vivenciamos a baixa qualidade do ar por alguns dias, quando passamos a respirar não apenas o ar das queimadas locais, mas em grande quantidade a fumaça vinda do Norte, que tomou conta de nossa cidade, e presenciamos o fenômeno da água da chuva lavar a atmosfera e cair escurecida no solo. Muitos de nós, nesse período, passamos por episódios de problemas pulmonares, alergias ou até mesmo situações mais graves, dependendo da sensibilidade e da saúde geral de cada um, bem como das condições de exposição à fumaça.
O impacto da fumaça nos seres humanos é bem conhecido, mas na flora e na fauna pouco se fala. Para os animais, penso ser esperado impactos semelhantes aos que ocorrem conosco, no entanto eles não têm a mesma possibilidade de abrigo, acesso a água e alimentos livres dos contaminantes da fumaça, e ainda, em geral, possuem menor massa corporal para suportar a carga de poluentes. Lembrando que os animais aquáticos, anfíbios e invertebrados são mais sensíveis às contaminações ambientais. Para a vegetação, durante os eventos mais severos de fumaça, penso ser esperada a diminuição da atividade de animais polinizadores e a redução da fotossíntese pelo depósito de fuligem nas folhas e o abrandamento da incidência solar.
Qual é o impacto ambiental dos desmatamentos?
São muito impactantes para flora e fauna. Os desmatamentos tem aumentado, tanto os legalmente autorizados, quanto os ilegais. Essa perda de vegetação florestal nativa fará muita diferença no futuro, com o crescimento da cidade e no contexto das mudanças climáticas.
Esses fragmentos florestais fornecem o que chamamos de serviços ecossistêmicos, ou seja, benefícios oferecidos pela natureza gratuitamente que permitem, por exemplo, a infiltração da água da chuva reduzindo a possibilidade de enchentes, abastecendo os aquíferos, perenizando nascentes; a regulação da temperatura e a liberação de umidade para o ar, entre outros benefícios.
Foz do Iguaçu criou recentemente parques municipais naturais, mas ainda é muito pouco, são áreas pequenas. Carecemos de parque urbanos e praças para a qualidade de vida da população. Temos o Plano Municipal da Mata Atlântica, praticamente não implementado. Poderíamos começar em não projetar ruas que cortem esses fragmentos florestais ao meio e pensar em leis de incentivo à criação de reservas particulares, oferecendo benefícios aos proprietários dessas áreas para ajudar a mantê-las conservadas. O município tem muito a fazer para preservar essas pequenas florestas.