Cláudio Dalla Benetta (*) I OPINIÃO
"Covid mata, p****". Substitua os asteriscos para completar um palavrão bem popular e terá o mote de uma campanha que o publicitário Nizan Guanaes assinaria, como ele disse em uma longa entrevista para a CNN Brasil, que já teve mais de 110 mil visualizações no Youtube.
Ficou curioso? Vale a pena assistir e ouvir. Ainda mais sabendo que Nizan foi um dos primeiros brasileiros a "pegar" o vírus. Ele calcula que foi o 60º (o último desta quinta pela manhã já era o 1.476.884º). Nizan ficou isolado e sua vida mudou.
Assista: https://www.youtube.com/watch?v=YTYSEi6BFhs
Mas o assunto não é Nizan, e sim a doença, na qual o prefeito de Ciudad del Este, Miguel Prieto, diz já não acreditar (levou tanta bordoada nas redes sociais que mudou de ideia rapidamente; o eleitor em primeiro lugar!).
Trabalhar com os números permite que a gente tenha uma noção da situação em que estamos hoje, principalmente em Foz do Iguaçu e no Paraná, já que no Brasil como um todo o que vivemos é simplesmente trágico. E nós, por aqui, como estamos em relação aos países que já passaram pela pandemia ou que ainda enfrentam o pico da doença?
Paraná, um país
Com seus pouco mais de 11 milhões de habitantes, o Paraná tem população maior que a de muitos países. É maior, por exemplo, que o Paraguai (7 milhões) e o Uruguai (3,5 milhões) somados. Seria "normal", portanto, que o Paraná tivesse mais casos e mortes por covid-19, proporcionalmente, que esses dois vizinhos do Brasil.
E tem mais, muito mais. O Paraná, ainda agora um Estado onde a covid-19 não fez tantos estragos como em outras regiões do País, registrava até o fim da quarta-feira, dia 2, exatamente 23.965 casos confirmados, ante 3.203 nos dois países – Uruguai com 943 e Paraguai com 2.260, conforme o painel on line da universidade americana Johns Hopkins, de onde, aliás, são extraídos dados sobre outros países, nesta matéria).
Isto é, o número paranaense é 7,5 vezes maior que nos dois vizinhos, cuja população somada é um pouco menor que a do Estado.
E em mortes? No Paraná, eram 650, até quarta-feira. Uruguai e Paraguai somam 47 mortes (no primeiro, 19, e no segundo, 28). A soma das mortes no Paraná é 13,8 vezes maior que a dos dois vizinhos brasileiros.
Um detalhe que mais tarde a gente comenta: o Paraguai usou de quarentena rigorosa, enquanto o Uruguai preferiu fazer testes e mais testes para manter a pandemia controlada. Os dois conseguiram, mas o custo pros uruguaios foi bem menor – ou está sendo.
Mais que três países
Mas saiamos dessa comparação tão próxima. O número de mortes no Paraná é maior que a soma das que ocorreram no Panamá (645), na Coreia do Sul (282) e no Paraguai (que só entrou no cálculo porque, com as 19 mortes, a soma chega perto do total paranaense).
Na Internet, quando se fala em números, imediatamente "ouvem-se" vozes iradas: não dá pra comparar o Brasil com países menores. Nem o Paraná. Mas dá, sim, porque a população da Coreia, somada à do Panamá e à do Paraguai, chega a 62,7 milhões de habitantes, que representam 5,6 vezes a população do Paraná.
Agora você entendeu que, mesmo proporcionalmente, a situação do Paraná não está boa. E não foi à toa que o governador do Estado decretou quase um "lockdown" para as áreas mais atingidas pela pandemia, como é o caso de Foz do Iguaçu.
Voltando aos números do Estado, até a quarta-feira haviam sido registrados 23.965 casos confirmados de covid-19. Se fosse um país, o Paraná estaria em 52º lugar. Como estaria em 39º em mortes, isso significa que o índice de mortalidade da covid-19 no Paraná é mais alto que a média dos 51 países que estão à frente em número de casos.
Foz do Iguaçu, um país
Se fosse um país de 260 mil habitantes, em que posição Foz do Iguaçu estaria no ranking dos países com mais casos de covid-19? Claro que numa posição confortável: em 132º lugar. Confortável? Nem tanto: estaria à frente de 57 países, entre eles o Uruguai, cuja população é mais de 13 vezes superior à iguaçuense.
A maioria dos países com número inferior ao de Foz, em casos confirmados, fica na África e no Oriente. Se fosse pra comparar com um desses países, vamos ficar com um bem conhecido, a Síria, com seus 16,9 milhões de habitantes, que registrou até agora 312 casos e 9 mortes, dois números bem abaixo dos que temos por aqui.
Com 11 mortes, Foz empataria com três países e estaria à frente de outros 25, entre os quais a Islândia (100 mil habitantes a mais que aqui) e a Jamaica (pouco mais de 2 milhões de habitantes).
Acredite, covid mata, p****
Só uruguaios são aceitos na Europa
Fechar tudo, decretar toque de recolher, limitar a liberdade de ir e vir são as únicas formas de combater a pandemia, correto? Afinal, foi o que fez o Paraguai, um dos países que, até agora, é considerado um "case" de sucesso na luta contra o novo coronavírus, junto com o Uruguai.
Mas por que apenas os uruguaios, na América do Sul, estão autorizados a entrar na comunidade europeia? Fora os próprios europeus, só os cidadãos do Uruguai e desses outros países podem "turistar" por lá: Argélia, Austrália, Canadá, Geórgia, Japão, Montenegro, Marrocos, Nova Zelândia, Ruanda, Sérvia, Coreia do Sul, Tailândia e Tunísia, além da China, desde que adotada a reciprocidade.
Moradores dos Estados Unidos e do Brasil deverão ser os últimos a ser aceitos pelos europeus, que por sinal foram os primeiros, depois da China, a enfrentar a pandemia. E, no começo, se deram mal, principalmente na Itália, Espanha, França e Reino Unido. Mas domaram o vírus, cada um à sua maneira.
Povo que entendeu o risco
O Uruguai, como foi dito, não impôs uma quarentena obrigatória. Mas, claro, adotou algumas medidas, como o fechamento dos shoppings (o restante poderia funcionar normalmente) e de escolas, inicialmente. Ninguém obrigou, mas 90% da população ficou em casa, no início da pandemia. E muitos comerciantes preferiram não abrir suas lojas, mesmo porque elas ficariam às moscas, como diz, em outras palavras, uma reportagem da BBC.
Deu tão certo que mesmo a oposição ao presidente reconheceu que o Uruguai "tomou boas decisões, todos os partidos políticos apoiaram as medidas sanitárias e a sociedade acompanhou", como disse à BBC o senador Carlos Mahía, da Frente Ampla.
A rápida conscientização dos uruguaios se deve à boa educação que a grande maioria da população recebe. E os uruguaios ainda contam com um sistema de saúde eficiente.
Mas, no combate ao coronavírus, o segredo foi "testar, testar e testar", como disse o médico Rafael Radi, da equipe que assessora a presidência do Uruguai, segundo a Folhapress.
O índice de testes no Uruguai chegou a 18.892 por milhão de habitantes, à frente do Brasil (que acelerou a testagem, nos últimos tempos, e está agora em 14.445 por um milhão), da Argentina (7.790 por um milhão) e do Paraguai (9.723 por milhão de habitantes).
Mesmo assim, houve um susto no último dia 19, conta a Folhapress, quando surgiu um foco de 18 casos (pra nós, parece insignificante) no departamento de Treinta y Tres, onde houve também a primeira morte depois de mais de duas semanas sem óbitos.
O presidente Luis Lacalle Pou, que assumiu em março, praticamente no início da pandemia, reconheceu que houve "um pouco de relaxo" e que seria preciso retroceder, quando tudo já estava funcionando, inclusive as escolas. Retrocedeu e mais uma vez a situação voltou ao controle.
O grande segredo do Uruguai não está em obrigar ninguém a fazer nada à força. "Campanhas de prevenção na TV e pronunciamentos constantes do presidente e das autoridades de saúde foram suficientes para conscientizar a população", disse Mariana Pomiés, da consultoria Cifra, à Folhapress.
Igualzinho ao que acontece aqui e no Paraguai, não é mesmo? Não é à toa que o maior temor dos uruguaios venha de fora, das fronteiras com o Brasil e a Argentina, país que também fechou tudo, como o Paraguai, mas ainda assim é o 25º no ranking, em casos confirmados, e o 34º em mortes.
Não é preciso lembrar que o Brasil está em 2º lugar no ranking de casos e de mortes, atrás apenas dos estados Unidos.
Covid mata, p****
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