Comércio paraguaio deve se preocupar mais com o dólar alto, não com free shop em Foz

Embora os comerciantes de Ciudad del Este digam que a abertura de free shops deve trazer desemprego lá, o problema maior é o real fraco.

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A autorização para funcionamento da primeira free shop de Foz do Iguaçu deixa os comerciantes de Ciudad del Este de cabelos em pé. Eles acham que, se o governo não tomar providências – uma delas seria um imposto único de 4% para todas as mercadorias importadas vendidas no comércio local -, poderá haver instabilidade social e desemprego em massa.

Mas pode ser que o problema seja ainda mais grave, para os comerciantes paraguaios, do que a abertura de lojas francas nas cidades brasileiras de fronteira. O pior é o real cada vez mais fraco, que tira o poder de compra dos brasileiros.

O jornalista alemão Alexander Busch, correspondente na América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung, publicou artigo em que explica a questão.

Busch conta que esteve na semana passada em Ciudad del Este e constatou que shoppings como o Monalisa ou o Paris estão vazios. "Até o típico engarrafamento matinal na Ponte da Amizade, entre Brasil e Paraguai, já se dissolveu no início da tarde. Assim, tão pouco antes do Natal, a cidade no triângulo fronteiriço costuma estar lotada. Os brasileiros costumavam comprar tanto que tinham que se empurrar através das multidões, como num bazar asiático", compara.

Ele ouviu os vendedores de Ciudad del Este, que explicam a "razão para o marasmo". Em unissono, diz o jornalista, a resposta foi: "O dólar forte!";

Com o dólar acima de R$ 4,00, a presença de brasileiros despencou. "Em breve os primeiros shoppings fecharão", disse um taxista para Busch.

Segundo ele "o prognóstico é realista". E a explicação é que o governo brasileiro está "deliberadamente permitindo que o real se enfraqueça. Esta nova política cambial é parte integrante das políticas monetária, fiscal e econômica do ministro Paulo Guedes".

"A economia brasileira está recebendo atualmente um novo fundamento, comparável, em seu radicalismo, ao Plano Real de 25 anos atrás. Desde a reforma econômica de 1994, o Brasil vinha tendo quase sempre um real sobrevalorizado. Isso agora vai mudar."

E por que isso? Busch explica que o real desvalorizado tornou-se possível porque as taxas de juros estão nos níveis mais baixos da história, e a inflação está controlada na casa de 3,5%.

Com a inflação nesse nível, o Banco Central não precisa aumentar "absurdamente" as taxas de juros. A inflação "é particularmente baixa porque a economia brasileira ainda está estagnada depois de uma severa recessão. A capacidade industrial é subutilizada, e o desemprego é elevado. Aumentos gerais dos salários e dos preços são, por conseguinte, difíceis de se aplicar. As exceções a essa regra, como o aumento dos preços da carne bovina devido à elevada procura na China, não mudam nada nesse cenário", diz o jornalista alemão.

Com as baixas taxas de juros, os fundos estrangeiros não estão mais trocando dólares por reais para investir em títulos brasileiros. Não há mais altas taxas de juros. Então eles retiram seu capital, demandam menos real, e o valor da moeda brasileira cai, explica o jornalista.

Pro governo, a desvalorização do real é útil: por um lado, as exportações do Brasil se tornarão mais competitivas; por outro, as importações estão se tornando mais caras, o que funciona como proteção para a indústria doméstica e o setor de serviços.

"A desejada abertura da economia, tal como planejada por Guedes e sua equipe, pode se tornar politicamente mais fácil de ser alcançada. Com uma participação no comércio exterior de 25% do PIB, o Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo", analisa o jornalista.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, acusou o Brasil de desvalorizar o real para ganhar vantagens no comércio exterior. Para Alexander Busch, dizer que o Brasil está manipulando o câmbio, não é verdade. "O ministro da Economia e o Banco Central do Brasil só estão deixando o real oscilar em um novo patamar."

E vai continuar assim. Os brasileiros, conclui o jornalista, "terão que se acostumar com a nova taxa de câmbio".

Ele lembra ainda o que o ministro Guedes respondeu à pergunta de o que ele aconselharia ao brasileiro que quer passar o Natal em Miami ou fazer compras por lá: "Fique no Brasil!".

A gente pode concluir: se os brasileiros vão ficar mesmo no Brasil, que muitos, então, aproveitem pra vir a Foz e fazer compras aqui na fronteira, incluindo Ciudad del Este e o novo free shop, que provavelmente estará aberto dentro de poucos dias.

Ainda há aquela boa notícia, de que a partir de janeiro a cota de compras sobe para US$ 500. E o turista ainda poderá comprar mais US$ 300 na free shop de Foz. Mas com o dólar tão alto, ajuda um pouco, mas não é o refresco esperado.

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