Itaipu anda na boca do povo. Ou: últimas e penúltima da binacional

Não é só mudança de diretoria, não. Itaipu ganha destaque político cada vez maior por causa da renegociação do Anexo C.

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Por Cláudio Dalla Benetta

A penúltima: o ex-ministro Gustavo Bebianno recusou, como prêmio de consolação, uma diretoria na Itaipu, oferecida pelo agora seu desafeto presidente Jair Bolsonaro.

As últimas: 

1. Na Assembleia Legislativa, o deputado estadual Galo, que representa Curitiba, manifestou preocupação com o fato de que, quando a dívida de Itaipu for paga, "no prazo de dois anos", (…) "Os royalties vão acabar e alguma coisa tem que ser feita para os municípios do Paraná que hoje recebem essa compensação. Se nada for feito, os municípios vão quebrar”, disse ele, segundo nota publicada no Paraná Divulga.

2. Na Câmara Federal, o deputado Gustavo Fruet (PDT) encaminhou ao ministro de Minas e Energia, almirante Bento Costa Lima Leite, uma série de propostas para elaboração de um "novo Tratado de Itaipu e seus anexos", como informa texto publicado no site do parlamentar.

Sobre a penúltima, não há o que comentar.

Gustavo Fruet e Galo: com maior ou menor conhecimento, de olho no Tratado de Itaipu.

Os royalties

Sobre a preocupação de Galo, do Podemos, dá pra adiantar que os royalties não vão acabar. Ele fala "em dois anos", mas na verdade a renegociação do Anexo C do Tratado de Itaipu, que trata das "bases financeiras e de prestação dos serviços de eletricidade", será em 2023. Ou daqui a quatro anos. Certamente, com muitos buchichos à toa e discussões, estas sim sérias, entre as "altas partes contratantes de Itaipu" (leia-se: governos do Brasil e do Paraguai).

Os royalties pela produção de energia elétrica estão previstos na legislação brasileira e Itaipu, como qualquer outra usina, continuará pagando enquanto estiver produzindo. Nenhum de nós, por mais jovem que sejamos, estará aqui no dia em que Itaipu deixar de gerar energia.

Mas, claro, a revisão do Anexo C poderá ter implicações nos royalties, hoje distribuídos ao Brasil e ao Paraguai, com base na produção, na cotação do dólar (moeda utilizada na usina binacional para esses compromissos) e outros fatores. Isso pode mudar, pra melhor ou pior, considerando os municípios. Mas os royalties, vale a pena insistir, não vão acabar. 

Mudanças no Anexo C

Já a proposta de Fruet, mais centrada, baseia-se no fato de que, quando chegar 2023, a dívida da Itaipu Binacional com a Eletrobras, contraída para a construção da usina, estará quitada. Se o orçamento da binacional não for alterado – e como hoje 70% do que Itaipu arrecada é pra pagar a dívida -,sobrarão cerca de US$ 2 bilhões no caixa. Ou US$ 1 bilhão pro lado brasileiro e US$ 1 bilhão pro lado paraguaio.

É de olho nessa dinheirama que Fruet propõe que esta "sobra", no lado brasileiro, seja investida no Paraná, onde a usina está instalada.

Fruet explica que o texto que encaminhou ao Ministério tem como base estudo técnico de Rogério Piccoli, hoje aposentado de Itaipu, que trabalhou com Euclides Scalco (ex-diretor-geral da hidrelétrica) no período de redefinição da dívida e investimentos.

(Um parêntese: Rogério Piccoli é extremamente competente e, de fato, um especialista no Tratado de Itaipu e seus anexos.)

Além dos investimentos em solo paranaense, Fruet também demonstra ao ministro de Minas e Energia que o custo unitário (tarifa) terá significativa redução a partir da amortização da dívida. 

“Os cálculos mostram que esse custo pode cair de US$ 22,60/MWh para US$ 8,77/MWh. Essa redução será repassada ao sistema? Chegará ao consumidor final? São questões que precisam ser enfrentadas na revisão do Tratado”, afirma Fruet. 

Uma correção: para o lado brasileiro, a energia de Itaipu sai por US$ 44 o megawatt-hora, o dobro do que prevê o estudo do deputado. No Paraguai, o custo é bem mais baixo, mas quem banca a diferença é o consumidor brasileiro.

Outra alteração sugerida por Fruet é em relação à parte do Anexo C que determina que os países donos da usina (Brasil e Paraguai) terão direito a 50% da energia produzida e apenas poderão comercializar o excedente entre eles. 

“Em 2017, o Paraguai utilizou apenas 10,7% do total de sua parte-metade. Ao que tudo indica, o mercado paraguaio ainda vai levar muitos anos para chegar a utilizar a integralidade da sua parte. Portanto, é fundamental que haja uma redefinição sobre o excedente”, diz.

O que parece extremamente lógico e é este, exatamente, o tema fundamental da revisão.

Paraguaios concordam?

A ideia de que a tarifa de Itaipu não seja rebaixada a partir de 2023, com o consumidor brasileiro bancando investimentos no Paraná, especialmente na região do entorno, não é novidade. Vem sendo defendida, meio veladamente, desde que se começou a falar na renegociação do Anexo C.

O grande problema é que, além de não reduzir o custo da energia elétrica para o consumidor brasileiro, o mesmo consumidor ainda estará "doando" US$ 1 bilhão para o Paraguai. 

Não é à toa que os paraguaios também sejam favoráveis a esta proposta, mesmo porque, em 2023, eles não terão outros mercados para vender a energia que lhes cabe em Itaipu, a não ser que invistam fortemente em redes de transmissão e distribuição, para alcançar os mercados da Argentina, Uruguai e Chile, por exemplo.

Mas o fato é que os paraguaios estão se preparando com afinco para as negociações com o Brasil. E o Paraguai tem tradição de extrair leite de pedra de negociações difíceis. 

É só o começo de uma discussão que promete ser loooonga!

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