Itaipu: Paraguai e Brasil têm razão e ambos blefam um pouco

Nem o Paraguai conseguirá consumir sua parte até 2023 nem o Brasil poderá abrir mão, facilmente, do que compra do vizinho.

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H2FOZ – Cláudio Dalla Benetta

O Paraguai diz que, até 2023, pretende consumir o máximo possível da energia a que tem direito em Itaipu. O Brasil garante que, quando o Paraguai conseguir consumir toda a sua metade, os leilões de energia vão garantir a substituição dessa energia paraguaia no mercado brasileiro.

Os dois lados têm sua dose de razão. Os dois lados também blefam um pouquinho.

A Ande, estatal que distribui eletricidade no Paraguai, está investindo para melhorar todo o sistema, para que o país possa consumir mais energia de Itaipu. Ao mesmo tempo, está descobrindo "gatos" dos mais variados, com furtos de energia significativos.

O presidente Mario Abdo Benítez diz que, até o final de seu governo, pretende melhorar todo o sistema elétrico. "Para poder, no momento de renegociar o Tratado de Itaipu, estar em condições de (o Paraguai) consumir nossa energia."

Atualmente, o Paraguai consome menos de 20 milhões de MWh por ano, das duas usinas binacionais, Itaipu e Yacyretá. Esta quantia equivale a pouco mais de um quinto do que produz Itaipu (96,5 milhões de MWh em 2018, dos quais a metade seriam pra consumo paraguaio). Isto é, nem dobrando o consumo atual até 2023 o Paraguai chegará perto disso. E tem Yacyretá.

A melhoria da distribuição pode ajudar – há muitas áreas no país que não têm atendimento ou é precário -, mas o Paraguai precisa que atrair mais indústrias se quiser passar mais perto da meta.

Quanto ao Brasil, substituir esta metade que cabe ao Paraguai não é assim tão fácil. Mas os cálculos não consideram que o vizinho toda sua energia rapidamente.

Pra ver como a parte paraguaia de energia que o Brasil consome é importante, basta lembrar que o presidente Jair Bolsonaro veio ao Paraná pra inauguração da usina do Baixo Iguaçu, que tem capacidade de 350 MW, pouco mais da metade da capacidade de apenas uma das unidades geradoras de Itaipu – são dez brasileiras e dez paraguaias. Ah, sim, Bolsonaro veio, mas não pôde ir a Capanema por causa da chuva.

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do governo brasileiro, estima que, a partir de 2023, a demanda paraguaia por energia deve crescer 5% ao ano. Essa redução na oferta, segundo a EPE, será absorvida pelo mercado brasileiro com tranquilidade.

"Dada a dimensão do mercado brasileiro e os cenários de maior ou menor crescimento na demanda no Paraguai, essa diferença é facilmente absorvida nos leilões de energia”, garante o presidente da EPE, Thiago Barral. 

De qualquer forma, ele diz que o Brasil está "olhando cuidadosamente essa questão de Itaipu. O Paraguai tem preferência pela sua parcela de energia e o Brasil tem preferência em comprar aquilo que o Paraguai não consome". 

Os dois países estão mesmo de olhos postos em 2023, quando será renegociado o Anexo C do Tratado de Itaipu. Brasil e Paraguai vão renegociar as condições comerciais, que vão levar em consideração também o fim da amortização dos investimentos e a redução no preço da energia produzida pela usina binacional.

Mais que no Brasil, no Paraguai essa é uma questão fundamental para o governo, já que a venda de energia é uma das principais rendas do país. Internamente, Itaipu também é importante pelo que desenvolve de obras e para a geração de empregos.

Para o Paraguai, a revisão do Anexo C "é uma causa nacional", diz o diretor-geral paraguaio da usina, José Alberto Alderete.

Haverá grandes temas em discussão, tendo como pano de fundo um patriotismo exacerbado, por parte do Paraguai, e uma certa tranquilidade do Brasil, a princípio, porque até lá certamente o país vizinho não terá como levar sua parte de energia para vender a outros países, como pretende.

Entre as grandes discussões que tomarão conta do cenário de eletricidade, segundo o presidente da EPE, estão: "como a energia de Itaipu será comercializada no Brasil: irá para o mercado livre? O preço continuará, como hoje, atrelado ao dólar? E o contrato será por quantidade?"

O Brasil está estudando tudo isso, mas, por estratégia, por enquanto não torna públicas as propostas que poderá apresentar. Ainda é muito cedo, afinal.

Do lado paraguaio, também se faz mistério, mas o governo já contratou especialistas internacionais para analisar toda a questão a levar à mesa de negociações. 

E não será uma negociação fácil, porque o Paraguai não quer ser tratado como o vizinho fraco que pouco representa. E o Brasil não irá ceder, também facilmente, a pedidos paraguaios, como ocorreu em governos passados.

Mas não haverá vencedores nem perdedores nessa disputa, por certo. O Paraguai terá, em 2023, metade de Itaipu, sem dívidas, e certamente conseguirá uma boa negociação no valor da energia a ser vendida ao Brasil. 

E, pro Brasil, contar com a energia não consumida pelo Paraguai continuará a ser um bom negócio, até que outras fontes de energia tornem dispensável esta parcela que os vizinhos detêm em Itaipu. 

Quanto ao Paraguai, terá energia farta e barata para oferecer a empresas do mundo inteiro, por vários anos. Isso não tem preço. 
 

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